Focadas no curto prazo, elas nem sempre discutem adequadamente seu futuro
Conduzir processos de sucessão empresarial, como o da
Lew’Lara\TBWA, é uma missão difícil em qualquer segmento da economia.
Mas alguns ingredientes complicam ainda mais a questão no mercado
publicitário. “As agências estão amarradas ao talento do fundador”,
analisa José Carlos Fonseca Ferreira, consultor e professor da Escola
Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). Para ele, as agências
brasileiras, historicamente, não souberam conduzir a questão de maneira
adequada. “Elas nunca foram eficientes em passar o negócio para os
funcionários, quando não existia um filho herdeiro. E os melhores
funcionários acabavam saindo e criando outra agência. No passado, muitas
deixaram de existir ou foram vendidas por não terem um sucessor”,
opina.
Claro que a questão está longe de ser exclusividade do
Brasil. Até os grandes conglomerados têm dificuldades em conduzir o
processo. O Publicis Groupe, por exemplo, empurrou o limite de idade
para CEO para 75 anos, a fim de que Maurice Lévy tivesse mais tempo para
encontrar seu substituto. Outros exemplos são citados por Ferreira. “O
Interpublic tem dificuldades claras com a questão. E ninguém sabe como
vai ficar o WPP porque o CEO Martin Sorrell não gosta muito de falar
nisso. E mesmo o Omnicom tem independência de seus líderes locais, o que
complica a sucessão”, aponta.
Horizonte inevitável
No
Brasil, especificamente, para cada caso de situação encaminhada há
outros que ainda estão se desenhando e os que não vislumbram essa
questão no horizonte. A gestão atual da AlmapBBDO, por exemplo, é fruto
de um dos mais bem-sucedidos processos de sucessão do mercado,
capitaneado por Alex Periscinoto em 1993. Já seus sucessores que se
mantiveram no comando da agência mesmo após sua saída, Marcello Serpa e
Luiz Madeira, dizem não ter um processo estruturado de sucessão para o
futuro. “Eles continuam na liderança”, resume a agência.
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Depois de algumas tentativas, Amado encontro em Musa o nome para sucedê-lo no comando
Crédito: Arthur Nobre
Entre as empresas brasileiras vendidas recentemente para as
holdings globais do setor e onde a questão da sucessão ainda não está
resolvida estão a DPZ e a Talent. “Se fizermos uma análise profunda de
agências que foram vendidas recentemente, vemos uma movimentação
política muito intensa para assumir a posição de CEO”, aponta Ferreira,
da ESPM.
Na DPZ, esta movimentação veio a público recentemente.
Em meados de 2014, o Publicis deve assumir 100% da agência. O processo
de sucessão se inicia com a contratação de um executivo que será co-CEO
no decorrer de 2013 e começo de 2014 e que, posteriormente, assumirá o
cargo sozinho. Para este fim, a agência negocia a contratação de Erh
Ray, ex-sócio da Borghi/Lowe. “Temos nos preocupado com a sucessão e
acreditamos que o grande ingrediente é a herança da filosofia de
trabalho que criamos. Não adianta deixar a agência para alguém que não
tenha a filosofia DPZ, com valores muito claros como o exercício da
verdade, do bom gosto e da moral nos negócios”, afirma Roberto Duailibi,
um dos sócios fundadores, ao lado de Francesc Petit e Jose Zaragoza. “A
sucessão, para nós, não é uma crise, mas uma oportunidade”, completa.
Para
Duailibi, a agência não terá dificuldades em conduzir o processo por
conta de suas características histórias. “Nunca tivemos apenas um cara
que ficava dando ordens. Sempre entendemos que uma empresa tem de
funcionar bem por si própria. A agência existe desde 1968 e, em 1972, já
nos perguntavam sobre sucessão. E digo que ela surgirá em algum momento
e a situação se resolverá sem contratempos, porque a empresa é forte”,
aponta. Ele ressalta, no entanto, que independentemente de quem assuma o
cargo, a participação dos três seguirá sendo ativa. “Nós trabalhamos
todos os dias e nos atualizamos sobre tudo”, afirma.
Apesar de
indefinições no passado e no presente, há agências que já conduziram ou
estão conduzindo processos de sucessão com aparente sucesso. Na Ogilvy, o
presidente do grupo, Sérgio Amado, que segue com papel operacional em
questões como novos negócios, havia tentado apostar em outros nomes, mas
foi Luiz Fernando Musa que despontou. “Tentei colocar vários CEO’s, mas
não deu certo”, relembra. A missão, assegura, é difícil. “Não é
possível gerar um processo sucessório sem o apoio das principais
lideranças”, afirma Amado. Mas a aceitação superior é apenas um dos
quesitos para um líder. “Ele enfrentou uma preparação dura para ir
subindo. O CEO precisa ter ou adquirir várias características, como
reconhecimento do mercado, defesa de argumentos, penetração na empresa e
ideias boas”, contabiliza.
Mas um fator tão importante quanto o
surgimento de alguém com perfil para ser CEO é que o antigo líder
executivo se preocupe com a questão. É nesse ponto que muitas agências
se complicam. “O principal problema é que o líder não pode se apegar à
cadeira.Precisa ser suficiente humilde para eliminar a questão de que
alguém quer tomar seu lugar e, em algum momento, precisa tomar essa
decisão”, frisa Amado.
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Roberto Justus e Marcos Quintela: sucessão definida em 2008
Crédito: Gustavo Scatena
Coaching do antecessor
Outra agência do
grupo WPP, a Y&R, definiu em 2008 que Marcos Quintela seria seu
líder do futuro. “Depois de três anos como vice-presidente de
atendimento, em agosto daquele ano, me promoveram a diretor-geral e
CCO”, relembra Quintela. No começo de 2010, ele se tornou CEO,
substituindo Roberto Justus, que seguiu como presidente do Grupo
Newcomm. Em julho do ano seguinte, conquistou espaço e virou sócio do
Newcomm.
A preparação de Quintela para assumir o posto foi
planejada e teve alguns capítulos importantes. “Ao longo do tempo,
intensificou-se meu processo de aproximação com todos os clientes e
passei a interagir mais profundamente com as questões administrativas e
financeiras da agência”, revela. “Contei com o coaching do próprio
Justus e, em paralelo, participei de diversos treinamentos e cursos de
gestão de pessoas e liderança”, completa.
A DM9DDB, hoje
comandada por Sérgio Valente, também informa ter um processo organizado
de sucessão, com etapas como mapeamento de talentos, avaliações,
feedbacks e treinamentos. Da mesma forma, existe um componente informal
importante. “Costumo provocar a turma aqui falando para eles empurrarem
seu chefe para cima ou para fora”, resume Valente. Ele diz não se
preocupar com o fato de ser o homem a ser sucedido. “Um executivo que
prepara isso abre espaço para agregar outras funções e assim crescer
ainda mais”, conclui.
O mercado publicitário depende como poucos
outros de seus líderes. E, geralmente, as metas em curto prazo, como
novos negócios e crescimento, estão à frente das em longo prazo na
cabeça dos CEO’s. Esses fatores combinados constituem o grande desafio
para quem ainda não está pensando no futuro. “Os dirigentes costumam
estar mais preocupados em conseguir novas contas e prêmios. Com isso,
concentram sua atenção em algumas áreas de gestão e deixam em segundo
lugar a criação de um plano de sucessão. O ideal é que tivessem um
documento formal, escrito e aprovado por sócios, gestores e sucessor”,
sugere Ferreira, da ESPM.
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