Se há um negócio em que parece não haver crise, é
no esporte — em especial, no futebol. A grande feira SoccerEx,
realizada na semana passada no Rio de Janeiro e pela terceira vez no
país, mais uma vez provou a força desse negócio, que ainda tem muito que
se profissionalizar no Brasil. Apesar de sermos o país do futebol, por
aqui as coisas não andaram como em outros mercados, como o europeu.
Questões econômicas e principalmente culturais
ainda servem de entrave, mas o fato é que o Brasil sediará uma Copa do
Mundo dentro de dois anos e terá de superar as barreiras para que tudo
funcione a contento. “O esporte hoje movimenta algo como R$ 79 bilhões e
a partir de 2013 o deslocamento de verba será ainda maior. A indústria
cresce porque há um movimento global de vínculo ao esporte. E uma coisa é
certa e comprovada em pesquisa: marcas que se vinculam ao esporte são
mais valorizadas pelos consumidores”, disse Walter de Mattos Jr.,
presidente do jornal Lance!, durante o painel “O poder da imagem no
esporte”, que discutiu direitos de imagem e principalmente a relação às
vezes conturbada entre clubes, marcas e atletas.
Mattos defendeu que empresas precisam agir com
mais planejamento, inserindo o investimento em esportes na estratégia de
marketing e não utilizando-se dele de maneira oportunista. “Ao
patrocinar um jogador ou clube, é preciso avaliar o que isso de fato tem
a ver com a estratégia da empresa. Muitas vezes, a companhia patrocina
um clube ou um atleta, mas não dispõe de verba para ativar o patrocínio.
Isso é um grande erro”, comenta.
Em sua opinião, quanto melhor planejado o
investimento, maior será o retorno e mais o negócio como um todo irá
crescer, pois as vantagens e o retorno do investimento se mostrarão mais
claramente. “Investimento em esporte não pode se resumir em compra de
propriedade ou mídia. É preciso haver estratégia clara, com ativação
massiva e criativa, seguindo as práticas dos Estados Unidos e da Europa.
Não podemos viver uma fase de euforia e depois num abismo pós-evento”,
concluiu Mattos.
À moda antiga
Para Ricardo Fort, diretor global de marketing
esportivo e patrocínios da Visa, a forma como os detentores de direitos
esportivos olham para os patrocinadores ainda é antiga, como
“financiadores” do negócio. “Nunca assinamos um contrato se não temos
pelo menos três vezes o valor da verba para ativar. Não ativar um
patrocínio é um desserviço”. O executivo disse que há uma percepção
geral de que o patrocinador é um mal necessário, que obriga atletas a
fazerem coisas estranhas. “O patrocínio deve contar uma história. E se
for boa, todo mundo vai querer ouvir e fica contente. Mas é importante
comprar a história certa”.
Mattos diz que um dos sinais do amadorismo que
ainda existe no país é a famosa profecia autorrealizável de que a mídia
espontânea justificará um patrocínio, o que em geral não acontece, e a
consequência é o fim do investimento. “É um vício no Brasil. Quantas
empresas entraram como patrocinadoras do vôlei, por exemplo, e saíram. A
mídia é apenas um elemento da equação”.
O jogador holandês Ruud Gullit confessou que se
tornou escravo da própria imagem e que sua decisão de cortar o cabelo —
um rastafari que ficou conhecido mundialmente — teve a ver com o desejo
de se libertar. “Sabemos que patrocínios são importantes, mas, em muitos
casos, os direitos dos atletas são esquecidos. Há muitos agentes
envolvidos com muitos interesses diferentes e está cada vez mais
complexo”. Maurício Assumpção, presidente do clube carioca Botafogo,
concordou com os demais participantes do debate que o único caminho é
profissionalizar cada vez mais a gestão dos clubes. “O clube é
gerenciador da relação atleta/patrocinador. Profissionais preparados
devem falar abertamente com os jogadores a respeito do fato de eles
serem parte integrante dessa relação e o quanto ela é importante para o
clube. E deixar claros os papéis de cada um”.
Para o dirigente, o projeto de naming rights de
estádios é um excelente negócio no Brasil, que ainda não emplacou
principalmente por falta de gente capacitada para entender o real
potencial do negócio. Um dos grandes problemas dos clubes, hoje, é como
transformar os jogos em atração para toda a família. O projeto de naming
rights deve emplacar a partir do ano que vem, quando valerá a regra de
que o nome oficial do estádio deverá aparecer nas chamadas oficiais da
mídia, o que até hoje não era obrigatório e prejudicava eventuais
patrocinadores.
Gestão
Também
há falta de bons profissionais de gestão esportiva no país. Cecília
Yoshizawa, vice-presidente de gestão de talentos do grupo IMX, disse que
ainda não há mão de obra no nível necessário para que o negócio evolua
como um todo. “O Brasil é atípico. Temos que tomar conta dos atletas, às
vezes de suas famílias. Aqui o relacionamento humano supera o
profissional, muitas vezes. Mas estamos melhorando, há gente jovem
chegando”.
Fernando Von Oerzer, vice-presidente de esportes
olímpicos da XYZ, acredita, como Mattos, que planejamento é a
palavra-chave para investir em esportes e que o caminho é buscar
empresas especializadas para evitar o amadorismo. “A gestão do atleta
vai muito além do patrocínio, por isso é preciso buscar empresas
especializadas”. Mattos acredita que está na hora de “rasgar a fantasia”
e buscar bons profissionais no exterior para trabalhar por aqui. “Há um
claro problema de gestão do esporte e nem todos terão o retorno
adequado. É preciso investir em bons profissionais ‘ontem’”, avisou.
Copa sem 3D
Esta
não deve ser a Copa do 3D no Brasil. É o que acredita Marcelo Campos
Pinto, diretor executivo da Globo Esportes, durante a discussão sobre o
futuro dos direitos esportivos, que contou com a participação de Stephen
Nuttall, do YouTube, na área esportiva. Ele acredita que ainda há muito
a melhorar na transmissão em alta definição (HD) antes de se pensar em
3D que, segundo o consultor inglês Andrew Croker, não é atraente para
esportes. A forma como os direitos de transmissão esportivos são
negociados no Brasil — em separado, com cada clube, pagamentos
antecipados e outras peculiaridades — foi considerado arcaico.
O papel do YouTube foi amplamente discutido no
painel e Nuttall esclareceu que não considera a rede concorrente de
qualquer outra plataforma. “Somos naturalmente complementares. Em alguns
casos trabalhamos com emissoras para permitir o streaming de eventos ao
vivo, mas ainda assim, nosso conteúdo agrega, não substitui”, disse.
Na Copa, não será diferente. Nuttall acredita
que o YouTube será um canal complementar e que poderá ser usado
inclusive pelas emissoras para disponibilizar material profissional para
torcedores. O conteúdo profissional, por sinal, aumenta cada vez mais.
“A internet não matou a TV. Hoje aumenta o tempo que as pessoas passam
diante da TV. Estamos na era das duas ou três telas vistas ao mesmo
tempo. Acredito que o YouTube pode ser complementar para as emissoras”.
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