Os problemas do Marketing que você tem que resolver
Para Alberto Cerqueira Lima, Presidente no
Brasil da Copernicus Marketing Consulting, ainda falta planejamento e
critério para marcas alcançarem melhores resultados em um mercado
promissor
A cegueira de algumas empresas em não se atualizarem às novas tendências do mercado ainda é o grande desafio
para o próprio crescimento das marcas. Lançando-se em espaços na web,
as companhias ainda não entenderam que as mídias sociais não devem ser
pensadas à parte, mas sim como ponto fundamental do planejamento. As
conclusões são de Alberto Cerqueira Lima, Presidente no Brasil da
Copernicus Marketing Consulting e com mais de três décadas de
experiência em Marketing.
Por 20 anos atuando como Diretor de Marketing da Companhia
Cervejaria
Brahma, Cerqueira acredita, por exemplo, que poucas empresas abriram os
olhos para as novas metodologias de pesquisa no Brasil. “As pesquisas
têm de ser feitas olhando para o futuro, não para o presente ou o
passado e, nesse ponto, a maneira de se pesquisar terá que mudar muito”,
diz.
Mesmo com um boom na forma de consumir e acessar os meios eletrônicos,
garantindo mais informação, na opinião do especialista, também não se
olha para o futuro na hora de construir uma estratégia de Marketing. A
fidelização é outro ponto polêmico e um desafio para as empresas. Cada
vez mais conectados, os
consumidores não têm se importado com a marca que compram: vale mais o produto do que o nome que vem escrito nele.
“É necessário conhecer profundamente o consumidor. Antes não tínhamos
essa consciência. Esse é um problema do Marketing, é ele que tem que
conhecer profundamente o consumidor, propagar informação e
serviços de atendimento”. Leia a entrevista na íntegra.
Mundo do Marketing: Como o senhor avalia o Marketing que é feito hoje no Brasil hoje?
Alberto Cerqueira Lima:
Alguns fatores trazem
profundas modificações no mercado e citaria pelo menos seis deles. O
primeiro é a mobilidade social. É preciso muito cuidado quando se ouve o
pessoal do Marketing falando em nova Classe C ou nova classe média
brasileira. Não existe uma nova Classe C como se os consumidores fossem
monolítico. A verdade é que são pessoas que já estavam no mercado e, na
medida em que têm mais poder aquisitivo, consomem de maneiras
diferentes.
O segundo ponto é o acesso ao crédito, que, seguido do avanço das
telecomunicações, modificou a forma de se consumir e, portanto, o
mercado do Marketing. Hoje há uma avalanche de celulares e, mais
importante do que eles, há sinal em quase todos os lugares do país.
Outro ponto é a redução dos custos de vendas em dispositivos digitais.
Não há uma pessoa da classes D que não possa abrir um financiamento e
comprar um computador.
O quarto ponto é a sofisticação da web e abertura às informações. Hoje,
somos meio mutantes, o nosso cérebro ligado a um smartphone tem mais
conhecimento que Einstein. E o quinto ponto é a tragédia do transporte
público aqui no Brasil, ou seja, temos mobilidade social, mas não temos
mobilidade geográfica e isso gera uma porção de implicações na maneira
que as pessoas se portam no momento de compra de produtos e serviços.
Mundo do Marketing: Essas mudanças na forma de consumir trazem que tipo de modificações entre consumidores e empresas?
Alberto Cerqueira Lima:
A falta de fidelização é um
grande ponto. Não há mais o caminho para ela. Vimos primeiro que há uma
mudança de ambiente, tanto por tecnologia quanto por mobilidade
econômica, que traz mudanças de comportamento de consumidores e
empresas. Dentro desse aspecto, o que acaba sendo mais importante nos
profissionais de Marketing mais antenados? Primeiro, conhecer
profundamente o consumidor e o poder das influências que existem sobre
eles. Existe uma abordagem que os norte-americanos chamam de "path to
purchase", que é o caminho para a compra, hoje muito fundamental na
escolha. Ele faz com que alguns critérios de fidelidade vão para o
espaço. O consumidor pode até comprar um Nescau, mas se encontrar um
outro chocolate em pó instantâneo pelo caminho, pode comprá-lo.
É necessário conhecer profundamente o consumidor, a questão da
distribuição é o grande desafio. Antes, não tínhamos essa consciência.
Atualmente, se não tiver um bom sistema de gerenciamento de crises, um
pequeno probleminha pode se transformar em um grande problema. Tudo isso
são problemas do Marketing, é ele que tem que conhecer profundamente o
consumidor, propagar informação e serviços de atendimento.
Mundo do Marketing: O senhor falou que é preciso conhecer
profundamente o consumidor de todas as formas. Como hoje as empresas
devem trabalhar suas pesquisas?
Alberto Cerqueira Lima:
As tecnologias estão trazendo
mudanças de comportamento e também devem ser consideradas ferramentas
de trabalho. Primeiro, é possível usar alguns modelos matemáticos para
olhar algumas informações do consumidor e prever comportamentos, o que
não se podia fazer há algum tempo.
O comportamento está relacionado com nossas necessidades. A rigor,
ninguém quer comprar nada, porém, existem necessidades de vestir, de
comer, de se esquentar. A necessidade fez com que a gente compre e somos
conduzidos à satisfação de necessidades. O que as pesquisas de hoje
precisam entender é que não basta ouvir opinião, mas sim ir mais fundo e
saber quais são as necessidades.
Algumas pesquisas são plenamente satisfeitas com o mercado e outras
estão aí indicando espaços em branco que podem ser preenchidos. É
preciso saber o que perguntar , quais as maneiras de se perguntar.
Existem maneiras de questionar usando escalas, as perguntas não devem
ser feitas de maneira aberta, que o entrevistado não saberá responder.
As pesquisas têm de ser feitas olhando para o futuro, não para o
presente ou o passado e, nesse ponto, a maneira de se pesquisar terá que
mudar muito.
Mundo do Marketing: Se nota uma competição muito acirrada cada
vez mais forte no mercado. Empresas tradicionais estão abrindo negócios
em setores antes não pensados, como a Editora Abril indo para o mercado
de eletrodomésticos. Até que ponto é oportunidade e até que ponto é
risco?
Alberto Cerqueira Lima:
Existem dois pontos para
serem analisados. Tem o mercado e as necessidades e tem o mercado da
oferta com uma personalidade. A Abril oferece uma personalidade séria e
por dentro da empresa tem a capacitação e a sua cultura. É fundamental
que essas coisas conversem entre si. A pergunta é: até que ponto o nome
Abril tem franquia para poder passar para esse tipo de mercado? Ou seja,
é preciso fazer estudos antes.
Recentemente fizemos um estudo para uma empresa de energia elétrica no
Nordeste que queria oferecer outros serviços. Após a pesquisa,
constatou-se que o consumidor tinha uma grande adesão ao fato da
segurança que a empresa fornecia. Ela não estava sendo vista como
simples fornecedora de energia, mas como uma instituição que tem zelo e
cuidado com a casa dos clientes. A partir de então, começou a oferecer
serviços de seguros contra incêndio, por exemplo. Porém, com relação à
Editora Abril com eletrodomésticos, a proposta não parece consistente.
Mundo do Marketing: Quais são os desafios das empresas hoje devido a segmentação do mercado?
Alberto Cerqueira Lima:
O grande desafio é que a
segmentação não seja mais vista de forma unidimensional e somente
intuitiva. Até um tempo atrás você pegava demograficamente, imaginando,
por exemplo, que toda mulher da Classe D, de 24 a 30 anos, tinha o mesmo
comportamento ou que uma pessoa consumidora de relógio Rolex teria que
se comportar de determinada forma. E não é mais assim. O grande desafio é
fazer segmentações multidimensionais. Uma mesma pessoa que compra
alimentos para casa pode ter outro comportamento ao comprar roupas.
É preciso levantar centenas de variáveis e ter critérios de segmentação
que deem retorno sobre o investimento. Isso não é muito intuitivo e é
um processo que leva mais tempo. Porém, a maioria das empresas ainda não
captou e continuará segmentando da mesma forma que se fazia há cinco,
10 anos, jogando dinheiro fora. A segmentação não pode ser mais olhada
trivialmente.
E tem mais, o consumidor pode não ter um valor intrínseco para
determinado produto, mas pode ser uma pessoa tão ligada em redes sociais
que passa a ter um valor virtual e isso precisa ser considerado hoje.
As empresas precisam partir da verdade de que nunca terão 100% do
mercado e, a partir de então, questionar qual a porcentagem do mercado
que deve atacar para ter uma rentabilidade, essa é a grande questão.
Mundo do Marketing: Com relação às redes sociais, hoje investe-se muito no setor. As empresas têm deixado algum passo para trás?
Alberto Cerqueira Lima:
Quando falamos em redes
sociais, estamos falando de um negócio que não é profundamente
conhecido. Nem todo mundo que acessa as redes sociais me interessa e
seria necessário um estudo de segmentação para fazer um trabalho
consistente. Os trabalhos desenvolvidos atualmente nas redes sociais são
feitos de uma maneira que não tem nada a ver com o resto, incluindo aí
pontos de venda, distribuição e mídia offline. Era preciso haver uma
orquestração que muitas vezes não ocorre, as empresas agem como se as
redes fossem um ambiente à parte. Elas não fazem parte do planejamento e
as verbas destinadas são o troco do que sobra nas companhias. O mercado
hoje é multimídia e as pessoas também são. Para integrar, tem que ter
conhecimento profundo do consumidor.
Mundo do Marketing: O Trade Marketing é um bom caminho hoje?
Alberto Cerqueira Lima:
A distribuição e o ponto de
venda têm uma importância como nunca tiveram, é como se fossem o momento
da verdade. Uso o exemplo do mercado de cervejas, setor que estive por
muitos anos. Há algum tempo, o Estados Unidos possuía um volume de
cervejas quatro vezes maior que o Brasil, distribuído em 250 mil pontos
de venda. Aqui no Brasil, no mesmo período, com um quarto de volume das
bebidas, o país tinha um milhão de pontos de venda. A diferença entre os
países era de um para oito, o que significa que nos Estados Unidos era
muito mais fácil fazer um trabalho específico e aqui muito mais
complicado. Pelo mesmo fato, o trabalho de Trade é importante e mais
complicado e cada vez mais precisa ser olhado com carinho.
Mundo do Marketing: O senhor comentou no início da nossa conversa que a Classe C não existiria. Por quê?
Alberto Cerqueira Lima:
Não tem Classe C no sentido
de bloco, existe, sim, mais dinheiro no mercado e, portanto, mais
liberdade de escolha. O único erro é imaginar que a renda define
comportamento, que todas essas pessoas têm um determinado comportamento
monolítico. Na verdade, a renda não define.
*Com reportagem de Leticia Muniz.
Nenhum comentário:
Postar um comentário