O Conselho Superior do Ministério Público (MP) decidiu por
unanimidade, em decisão divulgada nesta terça-feira no Diário Oficial do
Estado, não homologar o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) que
previa a regulamentação dos casos de atrasos para a entrega de imóveis.
Assinado em 26 de setembro pelo MP e pelo Sindicato da Habitação
(Secovi-SP), o documento deveria receber a homologação em 120 dias para
entrar em vigor, mas seguia em análise interna no órgão e sofria
críticas de representantes da sociedade civil.
De acordo com o conselho, a determinação no TAC de conceder um prazo
de tolerância para atrasos viola o equilíbrio contratual entre
fornecedores e consumidores – uma condição prevista no Código de Defesa
do Consumidor. “Tal cláusula de tolerância inserida nos contratos de
promessa de compra e venda […] não é igualmente estabelecida em favor do
consumidor, que não goza do mesmo benefício, no tocante aos prazos
fixados para o cumprimento de suas obrigações.” Segundo o CDC, são nulas
cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços
que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o
consumidor em desvantagem exagerada ou que sejam incompatíveis com a
boa-fé ou a equidade.
Caberia às empresas, segundo a decisão do conselho, assumir o ônus e
os riscos da atividade, além de estipular apenas um prazo para a entrega
das unidades. “Se a cláusula de tolerância, por até 180 dias, já vem
sendo há anos adotada pelo mercado imobiliário, disto resulta a
conclusão lógica e necessária de que o atraso na obra, dentro deste
período, é absolutamente previsível para as empresas.”
Os representantes do órgão alegaram também que homologação do
documento poderia interferir no andamento de oito ações civis públicas
propostas pela Promotoria de Justiça do Consumidor da capital pedindo a
nulidade de cláusulas de tolerância. “A homologação desse TAC submetido
a esse Conselho poderia vir a prejudicar ou, no mínimo, criar um
inconveniente para tais demandas, já que por meio de tal TAC se aceitou,
como legítima, a cláusula de tolerância que ainda se visa, por meio de
tais ações, invalidar.” A simples celebração do documento no ano passado
vinha sendo usada, de acordo com o texto do MP, como argumento pelas
empresas em ações na Justiça.
A deliberação cita ainda parecer favorável do procurador de Justiça
conselheiro Paulo Marco Ferreira Lima em um inquérito civil contra uma
construtora. Segundo ele, os valores previstos no termo como multa pelos
atrasos — 2% sobre o valor pago em única parcela e 0,5% mensais –
também não refletem os prejuízos ao consumidor. “Muito pelo contrário, a
irrisoriedade deste acaba compensando o inadimplemento por parte das
incorporadoras.”
Repercussão. Em nota, o Secovi-SP lamentou a não
homologação do TAC e se defendeu: “O sindicato ressalta que o prazo de
tolerância de até 180 dias é praticado há décadas nos contratos
imobiliários e amplamente aceito pelos tribunais, por ser um acordo
entre as partes perfeitamente legal. E as obrigações da incorporadora de
produzir um edifício com inúmeros itens e fornecedores são de natureza
diversa daquelas do adquirente, não existindo o desequilíbrio mencionado
na decisão do Conselho Superior do Ministério Público”.
A entidade lembra que a deliberação do MP não implica em proibição da
cláusula de tolerância, ”que é admitida pelo sistema legal e pela
jurisprudência”. O termo também teria o mérito de trazer a pacificação
das relações de consumo e estabeleceria normas de transparência e
penalidades contrárias às incorporadoras e favoráveis ao consumidor.
“O Secovi-SP adverte que, cumprindo o compromisso assumido com o
Ministério Público, continuará a recomendar a seus associados e
representados a utilização das cláusulas acordadas no TAC, pois
beneficiam o consumidor, e manterá sua firme busca por um diálogo
incessante e transparente com os inúmeros interlocutores do mercado,
especialmente o Ministério Público, a fim de encontrar uma equilibrada
relação de consumo, que pressupõe conhecimento profundo do setor e suas
especificidades, sem preconceitos.”
Outros agentes da sociedade, como o advogado especialista em direito
imobiliário Marcelo Tapai, do escritório Tapai Advogados, veem com
otimismo a decisão do Conselho Superior do Ministério Público. “Na
verdade, essa decisão significa o reconhecimento de um equívoco cometido
pelos promotores no momento de assinatura do TAC.”
O termo, segundo ele, não tem força de lei, mas, se homologado,
poderia reforçar o argumento das empresas em eventuais disputas na
Justiça. Agora, acredita Tapai, os consumidores terão mais respaldo nas
ações judiciais. “Houve o reconhecimento de um órgão superior depois de
uma revisão mais cuidadosa”, explica.
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