A receita parece mágica, mas há riscos à vista para o consumidor
As discussões do acordo comercial com o México e o aumento do IPI,
que afetou bruscamente a venda de importados no Brasil, foram prenúncios
de um movimento maior: o novo regime automotivo 2013-2017, que visa
três principais pilares: restrição às importações, estímulo ao avanço
tecnológico e proteção ao emprego no Brasil.
O primeiro pilar, de restrição às importações, nasceu do aumento do
número de importados de aproximadamente 160 mil em 2005 para 825 mil em
2011. A estratégia para combater a escalada foram o aumento do IPI em
até 30% para importados e a adoção de cotas para carros vindos do
México.
Para o segundo pilar, de estímulo à tecnologia, a nova regra define
que a maioria dos processos produtivos básicos devem ser feitos no
Brasil: oito de 12 processo até 2017 e dez de 12 processos após 2017.
Além disso, as empresas deverão investir 0,15% (0,5% a partir de 2017)
da receita bruta em pesquisa. Número relevante, dado que a média mundial
é 0,3%. Ainda é necessário investir 0,5% (1% a partir de 2017) da
receita em engenharia e tecnologia industrial.
O programa de etiquetagem veicular do Inmetro, que mede a eficiência
energética, também está vinculado ao regime. Com o aumento da
participação das empresas, espera-se também que tenhamos tecnologias
mais limpas e eficientes.
O terceiro pilar, de proteção ao emprego no Brasil, além de estar
correlacionado com as medidas contra importação, será estimulado pela
desoneração da folha de pagamento, na qual as empresas contribuirão com
20% a menos para o INSS. Essa renúncia fiscal representa R$ 7,2 bilhões
por ano aos cofres do governo.
Adicionalmente, os projetos de novas fábricas no Brasil serão
incentivados. Empresas planejando construir uma unidade terão crédito
tributário para ser utilizado quando a fábrica estiver funcionando, além
de receber cotas de importação para os modelos futuramente produzidos
por aqui. Essa medida dá mais segurança à companhia investidora, promove
a competitividade durante o período pré-produtivo e garante futuros
postos de trabalho.
Outra medida em paralelo, que busca avanço tecnológico e proteção do
emprego, é a mudança no cálculo do índice de nacionalização, que será
feito agora em referência ao custo de produção do veículo, e não ao
faturamento da empresa, como é feito hoje. Com isso, a meta será de 55%,
e apenas as companhias que atingirem esse índice poderão receber o
benefício da isenção dos 30 pontos percentuais adicionais de IPI.
Enfim, se qualificando para o novo regime, a expectativa é que as
empresas produzam veículos com mais conteúdo nacional, invistam em mais
engenharia e tecnologia, modernizando suas fábricas e seus produtos,
ofereçam ao mercado tecnologias mais eficientes energeticamente e operem
de forma mais competitiva.
Apesar de parecer a receita mágica, muita atenção é necessária nessa
transição para o novo regime. Criar grandes barreiras para produtos
importados pode colocar os produtos nacionais numa bolha, na qual a
falta de produtos superiores tecnologicamente a preços competitivos
trará acomodação aos produtos locais, reis de seu domínio com isenção de
impostos e baixa tecnologia. Há também o risco de encarecimento de
tecnologias locais com o investimento em pesquisa, desenvolvimento e
engenharia, caso gargalos de educação e infraestrutura não sejam
resolvidos, por exemplo. Precisamos confiar na competição interna por
market share e na guerra de preços como principais combustíveis a
incentivar as empresas a começar uma corrida tecnológica.
Para o consumidor, só resta esperar esse avanço tecnológico,
resultando em veículos feitos no Brasil mais equipados e com preços mais
acessíveis. Caso contrário, o Brasil continuará sendo o País que produz
veículos de alto volume com baixa tecnologia embarcada. E o importado
completo que você estava pensando em comprar ficará mais caro.
Stephan Keese é sócio responsável para o segmento automotivo da Roland Berger Strategy Consultants
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