Evento em São Paulo reúne 580 modelos e premia clássico de US$ 250 mil. Falta de incentivo fiscal e escassez de peças são entraves.
A frase de Og Pozzoli, um dos maiores colecionadores de carros antigos
do Brasil, com 170 exemplares, define de maneira romântica o que separa
carros antigos de carros velhos: “manter um automóvel em seu tempo e
espaço em condições originais, em uma espécie de volta ao tempo, define
seu valor histórico e sentimental. Por outro lado, um veículo de apenas
três anos já pode ser velho, caso não seja bem cuidado”.
A distinção entre veículos clássicos e velhos fica clara através dos
quatro principais destaques do Encontro Paulista de Autos Antigos:
Graham Paige Roadster 1928, Puma GTE 1972, Alfa Romeo Giulietta Spider
1962 e o Fitti-Fusca que Wilson Fittipaldi pilotou na década de 60. O
tradicional evento, realizado em Águas de Lindóia, no interior paulista,
reuniu 580 exemplares de épocas, países e estilos distintos entre o
último sábado (30) e esta terça-feira (1º).
Com dois motores e 400 cavalos, Fusca-Fitti foi usado por Wilson Fittipaldi nos anos 60 (Foto: ETC Comunicação/Divulgação)
Construído nos EUA, o único Graham Paige Roadster 1928 existente no
Brasil é avaliado em US$ 250 mil, segundo o proprietário Marcos
Vinícius. “Confesso que gosto de restaurar carros pela emoção de ser
premiado. Faço tudo com minhas próprias mãos, não mando em oficinas.
Nesse aqui demorei oito meses, que é um tempo recorde para restaurar um
modelo raro até mesmo nos EUA”, explica o engenheiro, dono também de um
Hupmobile Phaeton 1923.
Um dos modelos mais luxuosos de sua época, Graham Paige é avaliado em US$ 250 mil (Foto: ETC Comunicação/Divulgação)
Já Brenno Russio, dono do Puma GTE há seis anos, demorou três anos para
deixar o cupê como ele aparece nas fotos. “Ter meu trabalho reconhecido
faz todo o esforço ser recompensado”, comemora.
Puma GTE 1972 levou três anos para ser restaurado (Foto: ETC Comunicação/Divulgação)
O empresário Emanuel Zveibil tomou caminho diferente com seu Alfa Romeo
Giulietta Spider. Ciente da dificuldade em encontrar peças do modelo no
Brasil, o colecionador importou o conversível dos EUA. “Tenho outros
Alfas e um deles, um modelo 2300, acabei vendendo por conta da
dificuldade da restauração”. Zveibil explica que sua paixão pelo
Giulietta Spider começou quando era criança, assistindo a filmes
italianos. “Com o tempo descobri que não era fã especialmente do
Giulietta, mas sim da marca”. A paixão fez o colecionador fundar – e
presidir por anos – o Alfa Romeo Clube do Brasil.
Alfa Romeo Giulietta chegou pronta dos EUA (Foto: ETC Comunicação/Divulgação)
Placa preta
O maior sinal de reconhecimento da qualidade de um automóvel antigo é a placa preta (onde as cores das letras e do fundo se invertem), conquistada pelos carros com mais de 30 anos. A idade avançada, no entanto, não basta: o modelo deve fazer parte de um dos 120 clubes de carros antigos associados à Federação Brasileira de Veículos Antigos – a FBVA, que por sua vez é credenciada pela Fédération Internationale des Véhicules Anciens, a entidade máxima do antigomobilismo mundial – e alcançar 80 pontos, numa escala 0 a 100, em originalidade e conservação.
Especialistas dos clubes avaliam o carro candidato a ostentar placa
preta, avaliando inúmeros itens como motor, câmbio, cor, rodas,
interior, acessórios, etc. O custo de expedir uma placa preta (fora a
renovação do documento junto ao Detran) é de R$ 150.
Perspectivas
A maior concentração de carros colecionáveis está nos modelos das décadas de 50, 60 e 70, mas a falta de oferta de carros e peças dessas épocas pode sugerir certas limitações – já que tais exemplares dificilmente sairão das mãos de seus proprietários. Para o colecionador paulista Julio Penteado, no entanto, o futuro do antigomobilismo é promissor: “com o crescimento da economia e uma distribuição de renda mais equilibrada, mais pessoas vão poder, enfim, realizar o desejo de ter um antigo na garagem. E aí novos movimentos acontecerão, como a busca por novos modelos, de épocas e regiões diferentes. Não haverá falta de carro, é só mudar o foco da coleção”, explica o antigomobilista.
Roberto Suga, colecionador e membro da FBVA, destaca o bom momento que
vive o setor. “O antigomobilismo não cresce só no Brasil, onde sua
evolução tem sido estrondosa. O mercado de antigos tem alta no mundo
todo, e a consequência é a alta nos preços também”. Para ele, a alta tem
os motivos mais conhecidos, como paixão por carros aliada a laços
familiares, mas também um fenômeno peculiar: “Vivemos num mundo muito
tecnológico, com excesso de informações e novidades. O antigomobilismo
se tornou uma espécie de válvula de escape. Tanta modernidade é
contraposta com saudosismo, e o bem antigo mais representativo e
sentimental é o automóvel.
Penteado alerta, no entanto, que os antigomobilistas ainda encontram
dificuldades em preservar carros clássicos. “Encontro uma certa
dificuldade em importar peças, por conta da burocracia e dos altos
impostos. No Brasil, simplesmente não há incentivo fiscal para quem se
propõe a preservar a história do automóvel nacional”, lamenta o
colecionador, proprietário de sete modelos, que ainda sugere que o
antigomobilismo fosse agraciado pela lei Rouanet, que deveria reconhecer
a prática como atividade sócio-cultural.
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