Como criar programas para evitar que problemas financeiros atrapalhem o desempenho do pessoal
São Paulo - As dívidas
de um empregado, quando se tornam impagáveis, causam dor de cabeça -
para ele e para a empresa. Mesmo um funcionário exemplar pode começar a
chegar atrasado para resolver problemas com os credores. Muitos perdem a
concentração e cometem erros. Há quem peça para ser demitido para
receber a indenização - e lá se vão investimentos em treinamento e
planos de carreira.
Nos últimos tempos, mais pequenas e médias empresas passaram a contar
com programas para funcionários endividados. Segundo a Personal Finance
Employee Education Foundation, entidade americana que estuda os
benefícios da educação financeira em empresas, a cada 1 dólar investido
num desses programas poupam-se outros 3 com a redução de atrasos,
faltas e demissões - e o consequente aumento na produtividade. Veja os
resultados colhidos por quatro empresas que criaram esses programas.
1 Prevenção para os problemas
Quem é contratado pela rede de laboratórios Sabin, de Brasília, é
informado de que a empresa pode ajudá-lo a realizar um sonho, como
comprar um carro. Os 1.200 funcionários da Sabin podem receber o 13º salário e o dinheiro das férias antes do período legal. Também é possível pedir empréstimo — o deferimento depende do tempo de casa e do desempenho.
"É um estímulo a mais para motivar nossos funcionários", diz Janete
Vaz, de 57 anos, sócia do Sabin. Só que, com o passar dos anos,
funcionários que recorriam a esses recursos para quitar dívidas se
tornaram comuns. "Era um desvio da proposta original", diz Janete.
Chegou-se à conclusão de que seria necessária uma campanha educativa
para ensinar os empregados a administrar o salário. Uma vez ao ano
consultores financeiros dão palestras na sede do Sabin. Nessas ocasiões,
os funcionários aprendem a cortar despesas com inteligência e que tipos
de aplicação financeira são adequados a eles. Os holerites trazem dicas
para reduzir despesas domésticas, economizando luz e água.
Quem tem muita dificuldade de se manter na linha é encaminhado a um
psicólogo da empresa, que tenta ajudar o funcionário a encontrar
possíveis fatores emocionais que o estejam levando ao descontrole. Além
disso, um economista ou administrador o ajuda a calcular os efeitos do
rombo e a lidar com a situação.
"Em vários casos, podemos conceder um empréstimo se a origem da dívida
tem uma explicação razoável e se o funcionário não for reincidente", diz
Janete. Nesses casos, o empregado se compromete a anotar todas as
despesas em planilhas Excel e mostrá-las aos especialistas.
A recepcionista Lauanda Feitosa, de 28 anos, passou por tudo isso.
"Descobri que gastava 200 reais por mês em comida fast-food", diz. Pouco
mais de dois anos atrás, ela devia 10.000 reais aos bancos que
financiaram a construção de uma casa no terreno de seus pais. A família
se desentendeu, o terreno foi vendido e ela voltou a pagar aluguel.
Depois, perdeu pouco a pouco o controle das finanças - até que, em
janeiro de 2011, devia mais de 15.000 reais na praça. "Os credores me
telefonavam, eu ficava nervosa e corria ao banheiro para chorar", diz
Lauanda. Agora, ela está ressarcindo o Sabin, que lhe emprestou dinheiro
para pôr um ponto-final naquela situação. "Os descontos no meu salário
terminam em março do próximo ano", diz ela.
2 Dívidas renegociadas
Os 130 funcionários da Rutra Menswear — rede de lojas masculinas de
Campina Grande, na Paraíba, que faturou 14 milhões de reais em 2011 —
contam com a ajuda da empresa para renegociar dívidas pessoais. “Se for
preciso, nosso advogado discute os valores na Justiça”, diz José Artur
Almeida, de 41 anos, fundador da empresa.
Um dos funcionários apoiados foi o diretor de marketing Vinício
Veríssimo, de 23 anos. No fim de 2010, ele deixou de pagar 5.000 reais
de um empréstimo tomado dois anos antes, quando resolveu investir numa
empresa de hospedagem de sites. Veríssimo atrasou algumas parcelas. O
acúmulo de multas e o peso dos juros fizeram a dívida chegar, em meados
do ano passado, a 7.000 reais - três vezes e meia seu salário.
Com a assessoria do departamento jurídico da Rutra, Veríssimo entrou na
Justiça e conseguiu reduzir a dívida a 3.000 reais. Por sua vez, a
Rutra emprestou esse valor a Veríssimo. "Se não fosse isso, eu ainda
estaria com as finanças totalmente enroladas", diz.
3 Limites para o crédito
Quatro anos atrás, o analista de marketing Igor Pádua, de 27 anos,
trabalhava na mineira Policard, que faturou 40 milhões de reais
fornecendo cartões de antecipação de salário - benefício que muitas
empresas dão aos funcionários para fazer compras em lojas conveniadas.
Ele devia mais de 2 000 reais a vários cartões de crédito - faltava
dinheiro até para o aluguel.
"Funcionários endividados nos causavam desconforto", diz Luciano
Penha, de 34 anos, vice-presidente da Policard. "Criamos um plano para
atacar o problema."
Primeiro, o limite do cartão de compras fornecido a seus 276
funcionários aumentou cinco vezes — a dívida pode ser paga em até dez
parcelas, com juros mensais de 2,99%. Outra regra: a soma dos
adiantamentos dados a todos os funcionários da Policard não pode
ultrapassar 150% do valor total da folha de pagamentos.
Aulas de educação financeira completam o programa. “O aluguel e as
prestações do meu apartamento agora estão em dia”, diz Pádua.
4 Parcerias com os bancos
Há poucos meses, quando o chefe de montagem Ari Gorks, de 26 anos,
procurou ajuda da empresa onde trabalha — a paulista Cozil Cozinhas
Profissionais, que faturou 47 milhões de reais em 2011 —, a vida estava
um bocado apertada.
"Eu devia 5.400 reais ao cartão de crédito e não tinha como pagar",
afirma Gorks. A dívida fora contraída três anos antes, quando ele gastou
3.500 reais na construção do quarto do primeiro filho. Com muitas
outras despesas para honrar, Gorks começou a quitar só o valor mínimo da
fatura cada mês. Com os juros, não demorou muito para a dívida
disparar.
Há dois anos a empresa assinou com um banco um convênio para que seus
300 funcionários tenham acesso a empréstimos consignados — basta que o
funcionário tenha condições de quitar a dívida em até dois anos sem
comprometer mais de 25% do salário.
"Verificamos se dá para adiantar algum benefício e ajudamos na
renegociação da dívida", diz Oneri Berni, de 44 anos, sócio da Cozil.
Foi assim que Gorks resolveu seu problema. No fim de 2011, a
administradora do seu cartão aceitou diminuir a dívida em 26% e esticou o
prazo de pagamento.
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