Macacão D-air racing da Dainese utiliza um GPS para aumentar a precisão ao inflar o airbag
Nos primórdios do motociclismo, quando ícones como Giacomo Agostini e
Mike Hailwood vestiam seus capacetes de couro com óculos de aviador
para competir nas pistas, andar de moto significava ter coragem de
encarar o asfalto com pouca proteção. Felizmente, não é mais assim.
Atualmente, o bem estar dos pilotos se tornou tão ou mais importante do
que o desempenho das máquinas e as empresas do setor investem tempo e
dinheiro em maneiras de tornar o ato de pilotar cada vez mais seguro.
Do mesmo modo que acontece com os estudos sobre motores e
aerodinâmica, engenheiros e técnicos trabalham incessantemente para
criar equipamentos que protejam a vida dos pilotos. “Conhecimento
profundo sobre o motociclismo, desde o primeiro rascunho do projeto do
produto, é fundamental”, afirma Ricardo Asa, gerente de marketing da
Star Racer, distribuidora da marca Alpinestars no Brasil.
Desta forma, tecnologias foram desenvolvidas e outras, que até então
existiam apenas para os automóveis, foram adaptadas para motocicletas.
Novos materiais também passaram a ser incorporados para aumentar a
proteção sem abrir mão da leveza e, principalmente, do conforto. Por
conta disso, matérias-primas como kevlar, polipropileno, fibra de
carbono e até aço inox deixaram de serem termos exclusivos da indústria
aeronáutica e passaram a salvar vidas dentro e fora das pistas.
Protegido dos pés à cabeça
Embora o capacete seja a principal preocupação dos motociclistas,
outras partes do corpo também precisam ser protegidas. Foi assim que
surgiram equipamentos como o protetor cervical, que é feito em material
plástico, como o polipropileno, por exemplo. Como o próprio nome diz,
ele protege a coluna contra diversos tipos de impacto e é fixado com
alças laterais e uma cinta no abdômen igual a uma mochila. O protetor
cervical é usado “colado” às costas, por baixo do macacão ou da jaqueta,
embora já existam roupas que contam com o protetor integrado.
Bota usada por baixo do macacão tem articulação que evita torsões no tornozelo
Botas e luvas, sempre presentes entre os motociclistas, também
evoluíram. “Temos um modelo feito em kevlar e fibra de carbono que é
usada por baixo do macacão. Ela tem articulação axial no tornozelo e
impede o piloto de virar o pé para os lados, o que evita torções no caso
de uma queda”, comenta o gerente de produto Maurício Santana, da
BRMotorsport, representante da marca italiana Dainese no Brasil.
Para as mãos, luvas ergonômicas foram criadas. “As luvas da
Alpinestars são todas projetadas com os dedos pré-curvados na posição de
pilotagem e os modelos de competição apresentam uma união dos dedos
mínimo e anelar chamada ‘finger bridge’ que evita fraturas no dedo
menor”, conta Ricardo Asa, da Star Racer.
Luva tem finger-bridge entre o dedo mindinho e anelar para evitar fraturas
Entre os capacetes, no entanto, a novidade já não é mais o uso de
materiais leves como a fibra de carbono ou a série de testes dinâmicos
aos quais são submetidos antes de chegarem às prateleiras. Este ano, a
AGV apresentou o PistaGP, novo capacete do piloto Valentino Rossi, o
primeiro feito por meio do processo AGV Standards, no qual o molde para o
protetor é a própria cabeça do piloto, que é escaneada com laser. A
seguir, um software adiciona virtualmente o forro e as proteções de
bochecha e laterais à cabeça digitalizada, calculando as tolerâncias
necessárias para a retirada do casco. O resultado é um capacete sob
medida que eleva ao máximo o conceito de ergonomia em equipamento de
proteção. O piloto aprovou. “Sinto como se não estivesse usando um
capacete. A aerodinâmica aumentou e a visibilidade também é outra. É
como mudar da TV para o cinema”, afirmou Rossi. Embora já tenha
desenvolvido o GT Veloce, um capacete para uso nas ruas por meio do
mesmo processo, a AGV ainda não disponibiliza a tecnologia Standards
para “meros mortais”.
Sistema standard da AGV escaneia a cabeça do piloto…
...para criar capacete sob medida
A era do airbag
A primeira motocicleta do mundo a contar com o sistema airbag, que
até então era exclusividade dos automóveis, foi a Honda GL 1800 Goldwing
em 2006. De lá para cá, a ideia evoluiu e o equipamento passou a ser
integrado ao traje do motociclista. Os primeiros a chegar ao mercado – e
ainda disponíveis – contam com um sistema de acionamento por cabo,
sendo um lado preso abaixo do assento (ou guidão) e o outro ligado à
jaqueta. No caso do piloto cair da moto, o cabo se separa do encaixe
liberando em geral gás carbônico que infla as almofadas colocadas no
colarinho, nas costas, peito e cintura.
Sistema D-air street da Dainese conta com três sensores, que eliminam o cabo das jaquetas com airbag
Entretanto, esta tecnologia também evoluiu e os italianos estão mais
uma vez na vanguarda. Hoje, já existem sistemas de airbag integrados em
jaquetas e macacões que dispensam o uso do cabo. O conjunto D-Air
Street, da Dainese, por exemplo, opera com três sensores instalados
próximo ao freio dianteiro, no painel e no assento que se comunicam para
saber se o piloto foi jogado da moto e se existe a necessidade de
inflar os sacos de ar localizado no peito e nas costas da jaqueta.
Já nas pistas, a coisa é ainda mais sofisticada. “O equipamento faz
um monitoramento ativo do piloto através de uma série de sensores e
acelerômetros. A ideia é que o sistema entenda a movimentação do piloto,
analise constantemente e dispare no caso de uma mudança abrupta de
forças G”, explica Ricardo Asa, da Star Racer. A inovação da
Alpinestars, batizada de Tech Air Bag, ainda permite que o macacão volte
ao normal e ainda possa ser acionado novamente. “Após a queda, se o
piloto e a moto tiverem condições para voltar à prova, ele desinfla
totalmente em mais ou menos 5 segundos e tem uma segunda carga pronta
para disparo”, comenta.
A Dainese também conta com uma tecnologia similar à da Alpinestars
para proteger os seus pilotos dentro das pistas. O sistema da marca
italiana conta com três acelerômetros, três giroscópios e ainda utiliza
um GPS instalado nas costas do macacão – na região entre os ombros
popularmente conhecida como “cupim” – para auxiliar no mapeamento da
pilotagem e melhorar a precisão ao inflar o airbag. Por enquanto, as
tecnologias de airbag italianas ainda não estão disponíveis no Brasil.
Salvando o seu pescoço
Enquanto a maioria dos equipamentos de proteção para motociclistas
são oriundos da motovelocidade e são adaptados para outras competições,
um item específico foi criado para os pilotos de motocross. Trata-se do
neck brace, criado pelo médico sul-africano Chris Leatt após ele
testemunhar a morte de um piloto com o pescoço quebrado durante uma
competição off-road em 2001, na qual seu filho também participava.
Leatt-Brace começou nas pistas off-road, mas já tem versão para as ruas
Naquele ano, o doutor Leatt passou a desenhar um equipamento, feito
com base nos colares cervicais utilizados na ortopedia cuja função seria
simplesmente manter o pescoço em uma mesma posição, mesmo sob condições
de estresse do piloto. Como a aterrissagem após um salto de moto, por
exemplo. Feito em material plástico, o protetor se apoia na base do
pescoço e se prolonga até o início da coluna, onde se sobrepõe ao
protetor cervical, oferecendo proteção extra às costas. Em 2006, o
Leatt-Brace chegou oficialmente ao mercado.
Seis anos depois, outras empresas como a EVS e a Alpinestars já
apresentaram suas versões do neck brace e a própria Leatt criou outro
modelo para uso nas ruas. A tendência é que o equipamento se torne cada
vez mais popular em competições de diversos estilos e futuramente nas
ruas. Afinal, quando o assunto é equipamento de segurança, muito nunca é
o bastante. (Por Carlos Bazela)
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