Em uma das minhas caminhadas pelo calçadão de Ipanema, onde moro,
estava conjecturando sobre o mundo pós-PC. Pensando bem, o mundo PC
continua... Portanto, pós não seria muito apropriado. Mas só que PC
deixa de ser Personal Computer e passa a ser Personal Cloud. Ou seja,
saímos do modelo mental MyDocuments para MyDropBox.
Na prática, estamos vendo o surgimento de novas tecnologias móveis como
tablets e smartphones em um mundo cada vez mais conectado. Gradualmente
o mundo centralizado no PC que durante 30 anos foi o ponto central da
computação pessoal está migrando para a computação em nuvem, onde o PC é
um dos participantes. Não desaparece, mas perde sua relevância. Assim,
nossos documentos, nossas fotos, nossa vida pessoal deixa de ser
armazenada em discos rígidos dentro do PC ou laptop e passa a ficar
dentro das nuvens. Os aplicativos também começam a migrar do demorado e
monótono processo de instalá-los dentro de cada computador para ficarem
disponiveis 24 horas em alguma nuvem, localizada nem sabemos onde.
Claro que as mudanças de conceitos e mind-sets não são instântaneas. O
próprio PC passou por momentos dificeis para sua aceitação. Uma pequena
recordação histórica cabe aqui. Computadores pessoas já existiam antes
do PC, como o TRS-80 da RadioShack e o Apple II. Já existia a planilha
Visicalc. Mas eram vistos como brinquedos. A computação pessoal só foi
considerada séria quando a IBM, então no clímax do seu poder no mundo
corporativo, lançou o PC e criou toda uma indústria. Surgiram centenas
de desenvolvedores de software como Lotus, Ashton-Tate, Microsoft e
fabricantes de clones como Compaq e Dell.
Com os PCs, a computação mudou radicalmente. Passou de ser ferramenta
disponivel apenas à especialistas para ser usada por qualquer um, em
suas casas. Pequenas empresas passaram a ter condições de fazer
planejamentos financeiros e administrar seus negocios com mais
eficiência. Cerca de dez anos depois do lançamento do PC a computação
pessoal estava inserida no dia a dia de milhões e milhões de pessoas,
transformando a vida delas de forma tão profunda quanto a provocada
décadas antes pelos telefones e televisores.
Este processo não ocorreu de uma dia para o outro e no início enfrentou
muitas críticas. Lembro de muitas discussões quando implementando os
primeiros PCs em empresas e muitos dos seus gestores de TI, encastelados
nos então CPDs (lembram?) os chamavam jocosamente de
eletrodomésticos...
O mundo que podemos chamar pós-PC ou mesmo mundo-neoPC (lembrando que
PC passa a ser Personal Cloud) é um novo estilo de usarmos computadores.
Não somos agora mais dependentes de um único aparelho, o onipresente
Personal Computer, mas podemos ter acesso aos nossos documentos, fotos e
aplicativos a partir de qualquer dispositivo e de qualquer lugar.
É uma viagem sem retorno. Os usuários estão cada vez mais acostumados
com as facilidades proporcionadas pela mobilidade e interfaces
touch-screen. A próxima geração digital talvez nem saiba mais usar um
mouse e muito menos conseguirão imaginar porque era necessário copiar um
arquivo para um pendrive para então levá-lo para outra máquina.
Smartphones não usam pendrives!
Os computadores móveis, como tablets e smartphones, estão cada vez mais
intuitivos e não demandam especialistas para instalá-los e
configurá-los. Alguém conhece no mercado um curso de Facebook ou iPhone?
Os próprios usuários entram nos App Stores e escolhem eles mesmos os
aplicativos que querem e trocam idéias e sugestões entre si através das
midias sociais. São independentes.
Claro que temos aí um desafio para o setor de TI do mundo corporativo.
Os funcionários de uma empresa têm, pessoalmente, acesso a computadores
(tablets e smartphones) e aplicativos que querem usar nas empresas e
muitas vezes não o podem. O CEO e o estagiário têm nas mãos o mesmo
smartphone. Não há mais distinções entre quem tem tecnologia e quem não
tem. Não é mais uma questão de hierarquia, mas de hábito de uso.
Este mundo do Personal Cloud provoca uma profunda mudança no que deverá
ser a TI de uma empresa. Vamos debater alguns exemplos. Primeiro, as
velhas idéias de processos de homologação nos quais selecionava-se quais
dispositivos a empresa iria suportar não está mais adequada à
velocidade com que os aparelhos surgem no mercado. Estes processos
precisam ser revistos e modernizados. Em poucos meses o mercado de
smartphones e tablets muda significativamente.
Segundo, os usuarios hoje escolhem para seus smartphones e tablets os
aplicativos que querem, com interfaces intuitivas. Simplesmente vão a
uma App Store. Por outro lado, nas empresas, tem que lidar com muitas
barreiras para acessarem sistemas internos e precisam cursos de
treinamento de vários dias para poder usá-los. Talvez TI tenha que
repensar sua arquitetura. Claro que continuarão existindo sistemas
integrados e complexos, mas será que muitas vezes pequenos e intuitivos
apps não resolveriam muitos dos problemas dos usuários?
Além disso, porque dentro da empresa o usuario só pode ter acesso a
determinado sistema por um PC? Em casa ele acessa os serviços que quer a
partir de qualquer dispositivo.
Talvez possamos começar a pensar não apenas em um mundo monolitico de
aplicações complexas, mas em conceitos de uma app store interna,
acessível por qualquer aparelho. Uma arquitetura SOA onde as informações
e os aplicativos centrais poderiam ser acessadas por APIs vindas de
dispositivos móveis não poderia ser o cerne deste novo modelo?
Outra mudança é o conceito de self-service. Para se usar um DropBox ou
qualquer outro serviço disponivel em uma nuvem, o usuario vai lá e por
conta própria, se serve. É o conceito de self-service por excelência. E
ele se questiona... Porque, para cada coisa que preciso da TI na minha
empresa tenho que falar com alguém? Porque não posso ter auto-serviço
para solicitar o que preciso?
Na verdade estamos dando os primeiros passos em direção ao mundo do
Personal Coud onde não mais o PC, mas a nuvem será o centro das
informações e serviços de computação. Saimos do mundo dos equipamentos
para o mundo dos serviços. Cloud Computing é, em ultima instância,
TI-as-a-Service. Para a TI do mundo corporativo isto significa que cada
usuario, seja ele funcionário ou cliente, vai demandar acesso aos seus
sistemas de qualquer dispositivo, em qualquer lugar. E ele mesmo quer se
servir destes serviços. Neste cenário, TI deverá aparecer para seus
usuarios como uma nuvem.
O que os gestores de TI devem fazer? Bem, reconhecer que esta é uma
viagem sem volta e que embora muitos de seus antecessores tenham lutado
bravamente contra a entrada dos PCs e do modelo cliente-servidor nas
suas empresas, eles foram vencidos. O mundo do Personal Cloud está aí e a
pressão cada vez maior causada pelo fenômeno que chamamos de
consumerização de TI está forçando as paredes dos data centers. O modelo
BYOD (Bring Your Own Device) e mesmo BYOC (Bring Your Own Cloud) não
pode ser impedido de entrar. TI deve desenhar sua estratégia de como
adotar estes conceitos, preservando os critérios de segurança e
disponibilidade exigidas pela criticidade do negócio. TI deve repensar
os modelos de entrega de serviços aos usuários, via apps e self-service.
O usuário está cada vez mais auto-suficiente e TI deve assumir papel de
orientador ou facilitador, mas não de tutor. Este novo papel implica em
mudanças na maneira de pensar e agir da TI. Não é fácil.
Um aspecto fundamental do modelo Personal Cloud é que a arquitetura de
TI das empresas deverá ser baseada em computação em nuvem. Isto implica
no uso tanto de nuvens privadas ou internas, quanto publicas. Mas, cada
empresa deve desenhar sua própria estratégia de "cloudficação". Em
resumo, o futuro começa agora. Portanto, devemos dar logo o primeiro
passo...
Cezar Taurion é executivo de Novas Tecnologias
Aplicadas/Technical Evangelist da IBM Brasil. Formado em Economia,
mestrado em Ciências da Computação e MBA em marketing.
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