Com esporte no centro das atenções do anunciante, campanhas brasileiras se tornam mais estratégicas e globais
Depois de anos de muita promessa e pouco resultado, o esporte entra
de vez na cabeça do anunciante brasileiro, que passa a considerá-lo como
fundamental dentro da comunicação de sua marca corporativa. Alguns
estão mais adiantados, e outros muito atrasados. Mas há espaço para
todos e eles querem entrar na conversa. E isso impacta diretamente os
modelos de negócio e o dia a dia das agências de publicidade, que correm
atrás de soluções para se adequar ao desejo de seu cliente pelo assunto
mais quente do momento.
O primeiro grande reflexo é que elas
precisam se preparar para oferecer o esporte não como uma ação isolada,
mas como uma plataforma de comunicação. “O profissionalismo vai tomar o
lugar dos oportunistas. O Neymar está fazendo 25 campanhas ao mesmo
tempo, o que garante o futuro dele, da agência e do veículo. Mas esse
ciclo não protege o futuro do esporte. Em modalidades como o vôlei
feminino, por exemplo, falta valorizar quem está fazendo um trabalho
sério”, afirma Márcio Oliveira, vice-presidente de operações da
Lew´Lara\TBWA. “Temos de um lado o Banco do Brasil (cliente da agência),
que segura as bases do vôlei há 21 anos e, do outro, a Lupo (cliente da
G2), que coloca o Neymar no horário nobre. Quem acredita de fato no
esporte como plataforma de longo prazo?”, questiona.
Ao longo dos
anos, poucos encararam a área como algo sério e, geralmente, quando
falávamos de apoio a esporte, salvo raras exceções como Pirelli, nos
referíamos a empresas estatais ou de economia mista, como o próprio
Banco do Brasil. Mas agora, as empresas da iniciativa privada de todos
os portes querem entrar em campo e ficar.
Nos Jogos Olímpicos de
Londres já foi possível identificar campanhas que encaram o esporte como
estratégia, como a de Sadia, que, após um profundo estudo da Bullet
sobre o tema, decidiu apoiar três confederações brasileiras: desportes
aquáticos, ginástica olímpica e judô. O projeto, que continua após
Londres, envolve a DPZ como agência, a Bullet como promocional e Golden
Goal como especializada em marketing esportivo. A ação estava,
inclusive, preparada para os resultados dos jogos, já que o comercial da
campanha sofreu uma mudança após os resultados de Diego Hypólito, que
fracassou, e de Artur Zanetti, que ganhou o ouro. Antes desconhecido, o
atleta acabou substituindo o companheiro até então mais midiático no
comercial online. “De modo geral, a situação ainda não é bem resolvida
no Brasil. Estamos caminhando para construir relação de marcas mais
duradouras com os atletas. E as agências começam a entender que não
adianta patrocinar atletas, mas ativar”, afirma Aldo Pini, head de
planejamento do Grupo Talkability, dono da Bullet.
Outro exemplo vem da WMcCann, que conquistou em março a conta “olímpica”
de Bradesco. A ação é voltada para os Jogos de 2016, que tem o banco
como um dos patrocinadores locais, mas começou com o lançamento da
campanha “Agora é BRA” cem dias antes dos jogos de Londres. A agência
aproveitou o que o seu chairman Washington Olivetto chama de “um
daqueles adoráveis e memoráveis óbvios que acontecem de vez em quando na
propaganda “ para relacionar as iniciais pelas quais o Brasil é
conhecido com o nome do banco. O mote estará presente em todas as ações
de ativação até 2016.
De seu lado, os anunciantes de origens internacionais se movimentam no
Brasil muito por conta do posicionamento de suas matrizes, que
aproveitarão o fato de que o país será o centro da comunicação de
esporte nos próximos quatro anos para dar mais trabalhos às agências
locais. Ou seja: pela primeira vez em suas histórias, as costumeiramente
isoladas agências brasileiras têm a chance de se tornarem
internacionais, aproveitando a carona providencial do esporte.
A Johnson&Johnson, por exemplo, já lançou a campanha para ativar
seu patrocínio à Copa do Mundo de 2014, criada pela JWT do Brasil. A
ação focará no posicionamento “Carinho inspira Carinho”. Já a P&G,
que é patrocinadora dos Jogos Olímpicos até 2020, ainda não começou a
planejar a campanha, mas a Wieden+Kennedy de São Paulo deverá ter papel
de liderança na campanha dos Jogos de 2016. Ela, inclusive, já colaborou
com a unidade de Portland na campanha global “Obrigado, Mãe”, para os
Jogos de Londres.
A Coca-Cola, que é patrocinadora da Fifa e das Olimpíadas, ainda não
definiu sua campanha para a Copa de 2014, mas entregou para a mesma
Wieden+Kennedy de São Paulo a missão de criar a campanha global da marca
para o evento. Além disso, a Ogilvy terá a missão de trabalhar a marca
de Powerade, de Coca-Cola, para a Copa de 2014 em toda a América Latina
(a agência anuncia a conquista da marca para o Brasil), e a David
cuidará de Sony para a Copa. “Desde 2007, a explosão do esporte já
estava prevista no nosso plano de negócios. Hoje, não dá mais para estar
no mercado de agências no Brasil e não pensar nisso”, afirma Luiz
Fernando Musa, CEO da Ogilvy.
Além da exposição internacional
para as agências, o Brasil pode se considerar também mais próximo de
prêmios. A Wieden+Kennedy de Portland, por exemplo, conquistou um Ouro
em Film Lions em Cannes graças a ‘Obrigado, Mãe”. O que impede o
escritório paulista de conseguir o mesmo? Diante dessas possibilidades,
talvez o Brasil comece a compreender porque peças como o festejado
comercial “Pesadelo”, da Duda Propaganda para Guaraná Antarctica, que
mostrava Maradona com a camisa do Brasil, não ganham nada em categorias
como Film Lions. Apesar de engraçada, a peça era muito local, com
produção restrita e anos luz distante do que se faz em esporte para
marcas como Nike, Coca-Cola e, agora, P&G.
+
Fabio Laudisio, da LOV: "As agências de publicidade, se não ainda
tem uma área interna de esporte, podem ao menos ter um braço"
Crédito: Divulgação
Agência busca seu lugar
Campanhas de
longo prazo como estas, no entanto, ainda são minoritárias quando se
observa o mercado em uma ótica mais ampla. E a falta delas demonstra que
as agências brasileiras atravessam um processo anterior ao lançamento
de grandes plataformas de comunicação: elas ainda estão encontrando o
seu território no esporte, que nem sempre é a posição de líder do
processo. No caso de Sadia, a DPZ ficou à frente da campanha no primeiro
semestre, mas no segundo quem o fará é a Bullet, por conta do foco mais
promocional. “Não importa quem vai liderar, mas sim quem vai
participar. É uma construção em conjunto que envolve inclusive os
clientes. Há muitos riscos no marketing esportivo e as agências precisam
se unir para dar certo”, avisa Rodrigo Coelho, diretor de planejamento
da Momentum, agência que fez sociedade com o ex-piloto Emerson
Fittipaldi para criar o braço Momentum Sports no começo deste ano.
Por
necessidade, as agências estão muito mais próximas das empresas
especializadas em marketing esportivo que atuam há muito tempo no
mercado, o que, em uma primeira análise, pode gerar concorrência. “Como
tudo em comunicação, ainda existe muita mistura em relação às
estratégias das marcas associadas aos esportes. Mas a relação parece
caminhar muito mais para parcerias. A agência se aproxima de empresas de
marketing esportivo para trazer inteligência que será ativada pela
propaganda”, acredita Pini.
“Há uma grande aproximação. Antes,
agências de publicidade e de marketing esportivo nem se comunicavam”,
observa Fernando Martinho, que chegou à NBS em maio para ser gerente de
projetos ligados ao futebol. “O papel da agência não é competir, embora
possa haver similaridades em alguns momentos. Mas não vejo
incompatibilidade. Temos ótima relação com a Octagon, no caso de um
cliente, a Oi (patrocinador da Copa de 2014). O papel da agência de
marketing esportivo é identificar caminhos e o da agência é de
comunicar”, afirma o profissional, que é especialista neste esporte e
traz experiências como a de projetos de ativação e conteúdo para a
torcida do River Plate, na Argentina. Sua função na agência é
desenvolver ações promocionais e parcerias.
Os modelos de atuação
no mercado de comunicação do esporte são diversos. A Ogilvy, por
exemplo, aposta na 9ine que, embora independente, está ligada
umbilicalmente à agência. Outras apostam em áreas internas ou mesmo
parcerias com fornecedores externos. Até pela indefinição do mercado, há
parcerias que se desfazem, como a da BSB com a NeogamaBBH na Sport
Strategy, cujos profissionais voltaram para a BSB. Mas na mesma
velocidade que alguns modelos não funcionam, outros surgem. “O marketing
esportivo é um mercado ainda muito jovem e não possui uma fórmula”,
aponta Coelho, da Momentum. “Em pesquisas com clientes, descobrimos um
buraco entre agências de marketing esportivo especializadas, que
entendem do atleta, de como fazer negociações de contratos, e a
prestação do serviço clássico de comunicação. Queremos nos posicionar
nesse meio, intermediando o que o esporte pode dar para a marca e o que a
marca pode dar para o esporte”, afirma, sobre a Momentum Sports, que
atua exatamente na faixa a que se propõe a 9ine. Coincidentemente, as
duas apostam em ex-atletas para vitaminar as operações: Fitipaldi, na
Momentum, e Ronaldo Nazário, na outra.
E há diversos outros
modelos no mercado. “Não existe uma forma certa e uma forma errada”,
aponta Coelho, da Momentum. “As agências de publicidade, se não ainda
tem uma área interna de esporte, podem ao menos ter um braço”, completa
Fabio Laudisio, diretor de esportes da Dentsu, que atua dentro da LOV,
agência do grupo que mantém a porção digital da conta de Sony,
patrocinador da Copa do Mundo, cuja verba off-line foi para a David. O
profissional era gerente de esportes para o Cone Sul da Red Bull e,
antes disso, ajudou a Oi no seu projeto de esporte para os Jogos
Panamericanos de 2007.
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Alexandre Martineli, da Publicis Dialog: “Os jogos de 2016 servem para todas as marcas possíveis e imagináveis"
Crédito: Divulgação
Laudísio, assim como Martinho, da NBS, são reflexos de outra
necessidade das agências, que precisam contratar profissionais ligados
ao tema para ser “o cara” de esportes. É o caso também de Alessandro
Martineli , contratado pela Publicis em 2011 como diretor-geral da
Publicis Dialog, o braço de ativação da agência. Embora sua função não
seja apenas ligada ao esporte, não dá para negar a relação, já que ele
foi consultor de marketing esportivo da Caixa Econômica Federal entre
2004 e 2007, liderando investimentos em modalidades como a ginástica
olímpica. Seu histórico no mercado remete a 1999, quando ajudou o
Botafogo de Ribeirão Preto a se destacar pelo marketing. Passou por
projetos como o que fortaleceu a categoria de automobilismo Stock Car,
atendeu Banco do Brasil na então Fischer América e tem pelo menos um
projeto que lamenta não ter tirado do papel, que previa a divulgação do
campeonato brasileiro na China, um mercado vital para a
internacionalização dos clubes.
Cabe a gente como ele dar conta
de mais uma grande função das agências de publicidade: a de conectar
dois mundos de totalmente diferentes. “É difícil fazer a ligação da
linguagem do esporte para a do marketing. Há distinções que envolvem
cultura, termos empregados ou mesmo preparo dos profissionais de cada
lado. Em meio a isso, as agências precisam assumir o papel de traduzir o
negócio”, afirma. “Precisamos remar nos dois prismas e amarrar direito
todas as pontas. O esporte no Brasil é muito peculiar, tem viés forte de
política. Por isso, é preciso saber se relacionar com pessoas e egos de
atletas, que são como artistas”, afirma Oliveira, da Lew´Lara\TBWA.
A
boa notícia para marcas e suas agências é que ainda há tempo para se
envolver, pelo menos para os Jogos Olímpicos. “Os jogos de 2016 servem
para todas as marcas possíveis e imagináveis. Não estou falando apenas
das marcas grandes que têm as cotas de patrocínio. As menores podem se
aliar a atletas e confederações de menos expressão, por exemplo”, aponta
Alessandro Martineli, da Publicis Dialog. “Eu estou há um ano tentando
negociar o boxe do Brasil sem sucesso. E, agora, tivemos três medalhas e
todos querem”, exemplifica, sobre as oportunidades perdidas em um
esporte no qual o País já tinha campeões mundiais. Agora mais
estruturadas para o esporte, as agências de publicidade, em parceria com
profissionais ou agências especializadas, serão as grandes guias de
seus clientes para entender o mundo do esporte e não deixar essa
oportunidade histórica passar.
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