Agências investem em treinamento de profissionais; nova geração é atraída pela chance de crescimento
Nos últimos cinco anos, poucas áreas se desenvolveram tanto dentro
das agências de publicidade quanto a de recursos humanos. Se a
propaganda, historicamente, nunca primou pelo cuidado extremo com seus
funcionários, hoje incorporou expressões como “plano de carreira”,
“benefícios” e “capacitação” à sua prática diária. Várias agências
montaram departamentos de RH, trazendo para dentro de casa profissionais
que afirmam ter vindo do “mercado formal” e reconhecem que trabalhar em
agência de publicidade é de fato diferente. E trazem ventos de mudança
para essa que sempre foi — e continua sendo, em certa medida — a
indústria do “para ontem”, onde virar noites e fins de semana sempre foi
rotina. E a pressão chega a provocar crises de choro rotineiras entre
funcionários menos preparados para a linha de frente.
Propaganda não é mesmo para amadores. Nunca foi e jamais será. Ao
mesmo tempo, para um nova geração de profissionais que domina a cena, o
que faz mesmo diferença é a alegria de fazer o que se gosta e ter
oportunidade de crescer, mais do que o salário. O que está realmente por
trás da consolidação das áreas de RH nas empresas é a necessidade de
reter seus talentos mais preciosos — aqueles que já rendem ou que
prometem render bons resultados para o negócio. Perder bons
profissionais tornou-se um prejuízo bem maior do que em outros tempos,
quando ser generalista funcionava e havia gente preparada a rodo
circulando no mercado.
Mas o fato é que o mundo mudou. O cenário demanda muitos novos
talentos e habilidades difíceis de encontrar, demanda reciclagem e
atualização permanentes. “É preciso reconhecer que de fato há uma maior
profissionalização do RH das agências. Estamos em um negócio feito por
pessoas, em que as empresas em grande parte foram construídas por ‘self
made men’, do jeito deles, sem um olhar muito específico para técnicas
de RH. Em outros tempos, encontravam-se consumidores com tiros de canhão
de resultados imediatos e homéricos. O negócio se sofisticou, exigindo
das agências maior apuração técnica. Com isso o RH ganhou uma série de
desafios”, avalia Marcio Oliveira, vice-presidente de operações da
Lew’Lara/TBWA.
Segundo a visão dele, a área de RH tem três grandes desafios: atuar
na formação profissional, no clima da agência para manter funcionários
permanentemente motivados e na criação de perspectivas e plano de
carreira para os colaboradores. “A nova geração não se importa em mudar
inclusive de profissão de uma hora para outra. Antigamente construíamos
uma carreira, e hoje o que valem são os novos desafios, que levam a
novas carreiras e constantes possibilidades de mudanças”. O foco dos
programas de treinamento das áreas de RH que se formaram dentro de
agências de publicidade está voltado, principalmente, para aprimorar
técnicas de negociação, técnicas de apresentação e a capacidade de
liderar. Para os presidentes e diretores, engloba coaching e a
participação em cursos de administração sênior no exterior.
Oliveira retornou recentemente de um curso do Sênior Management
Program da Omnicom University, em Harvard, voltado para discutir como
lidar com desafios com base em cerca de 25 cases. Na Lew’Lara também há
programas permanentes de treinamento em técnicas e apresentação e
negociação. “Com as áreas de procurement nos anunciantes a necessidade
de aprender a negociar é ainda mais vital”, observa Oliveira. Na opinião
dele, os programas de treinamento criam fidelidade e ajudam realmente a
reduzir a evasão de pessoas.
Universidade
No Grupo ABC, a Universidade ABC, criada há um ano, é uma plataforma
de aprendizagem que inclui inúmeros programas como Fórum de Líderes, que
teve mais uma versão realizada em São Paulo há cerca de três semanas e
que traz palestrantes de várias áreas para debater de tecnologia a
olimpíadas junto a cerca de 200 pessoas do grupo, em sua maioria
diretores. Também na Universidade ABC, há uma parceria com a Harvard
Business School para oferecer dois cursos de formação: o Owner President
Management Program — voltado para ceos, presidentes e sócios — e o Key
Executives Program, focado no desenvolvimento de lideranças. Este último
tem como foco a gestão de empresas e aborda liderança, estratégia,
marketing, contabilidade e finanças, inovação e negociação.
A universidade ainda tem o Programa de Educação Executiva em Gestão
de Negócios, em parceria com o Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper –
Ibmec São Paulo), que já treinou 90 executivos. “Esses programas têm
sido estratégicos para potencializar nosso capital humano e reter
talentos”, diz José Ricardo Amaro, diretor de recursos humanos do grupo.
Ele participa há dois anos de um grupo informal bimensal que reúne
entre 15 e 20 heads de RH de agências para compartilhar experiências.
Recentemente, o grupo realizou uma pesquisa de remuneração e benefícios.
“Nossa principal questão é o desenvolvimento de lideranças. Acreditamos
muito no casamento entre gestão, processo e criatividade. Fomos
pioneiros nessa quebra de paradigma de que os processos não inibem a
criatividade dos publicitários, ao contrário, os resultados têm sido
ótimos”, diz Amaro.
Há programas de treinamento e incentivo a cursos em todas as áreas da
empresa. Amaro acredita que as premiações que as agências do grupo têm
recebido nos últimos anos de empresas exemplares para começar a
carreira, a mais admirada e melhor empresa para se trabalhar são
resultado direto desse esforço. “Nos últimos dois anos nosso turn over
diminuiu muito e nossas pesquisas de clima indicam que estamos no
caminho certo”, conclui Amaro.
Alex Isnenghi, vice-presidente de operações e atendimento da Fischer
& Friends, afirma que investir em treinamento é investir no negócio.
“Ou capacito minhas pessoas ou não consigo acompanhar o mercado.
Dependo deles e capacitação é diferente de formação. Temos que estar
sempre um passo à frente do consumidor”, observa. A empresa já teve a
Universidade de Comunicação Total, voltada para capacitar funcionários a
entregar o que sempre foi a maior promessa da empresa: a comunicação
total, integrada, como ferramenta para fomentar negócios.
Hoje o programa chama-se Reload FF, e inclui, por exemplo, o Papai —
Programa de Ajuda Para o Aprendizado de Idiomas, que subsidia 50% de
cursos de línguas e o CDF — Curso De Formação, que promove capacitação
em várias áreas da empresa. Há programas específicos para técnicas de
apresentação voltados para profissionais de atendimento, planejamento e
criação, e encontros periódicos para falar de temas gerais como
neurociência, mobile, games, classes emergentes. “Nosso objetivo é
entender e discutir gente. Trazemos convidados para falar disso”, diz
Isnenghi. Ele reconhece que o treinamento é um bom incentivo, mas as
perspectivas de crescimento dentro da empresa também são decisivas para
manter boas pessoas.
Plano de carreira
O plano de carreira é um dos principais pilares da área de RH da
Ogilvy, por exemplo, liderado por Patricia Fuzzo. O “Estrada Ogilvy”
atua na ambientação das pessoas na agência desde a sua entrada,
avalia–as anualmente em diversos quesitos, promove a constante
autoavaliação, e serve de norte para promoções e mapeamento das pessoas.
É possível descobrir o que falta e precisa ser complementado nas
carreiras, por exemplo, e quais treinamentos serão úteis e importantes
para cada perfil de profissional. Na Ogilvy os treinamentos têm foco em
liderança e negócios. “Também investimos muito no clima da agência, no
ambiente. Nossa preocupação é que os funcionários se adaptem ao
comportamento de seus chefes e percebam seu próprio potencial dentro da
empresa. Os jovens querem perspectiva e precisam de feedback”, diz
Patrícia.
Segundo ela, o investimento em liderança é importante porque há
profissionais muito jovens se tornando gestores, que são mais intuitivos
e precisam de apoio. Esses treinamentos são divididos em seis módulos
de dois dias cada ao longo do ano. A empresa também possui o Maestro
Mini MBA, um MBA em negócios cotados para várias áreas chave da empresa,
participa dos programas e treinamento anuais do grupo WPP com
professores de Harvard e do Hyper Island, um programa de treinamento de
seis meses para criativos, na Inglaterra.
Há também na JWT fortes investimentos em treinamentos específicos,
sobretudo em gestão de clientes e negócios do cliente. “O investimento
em treinamento é de suma importância. Trabalhamos com vários programas
de incentivo e treinamentos internos, a maioria da JWT e do grupo WPP.
Em vários casos, ainda, a agência banca custos em faculdades e afins,
dependendo do perfil do profissional e das necessidades da agência”, diz
Ezra Geld, coo da JWT.
Liderança
Na Grey 141, os principais programas de treinamento são o Making More
Leaders e o Making New Leaders, ambos focados em liderança. “Um deles
trabalha o desenvolvimento de diretores e gerentes, e o outro investe em
líderes do futuro. São programas essenciais para um mercado que atingiu
a maturidade e enfrenta um ambiente de negócios mais complexo”, diz
Thais Fonseca, consultora de RH da Grey, onde o coaching também ganha
força. “Os programas de treinamento dão ferramentas aos gestores para
manter suas pessoas, e a perspectiva de carreira por si só já cria um
ambiente mais produtivo. Cria-se assim um ciclo produtivo que não acaba
nunca”, conclui Thais.
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