segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Varejo: o “ex-patinho feio”

Crescimento do poder econômico da Classe C e possibilidade de consultas na web têm mudado a cara da propaganda no meio



Não é novidade que a nova classe média brasileira e a expansão da internet nos lares — inclusive nas casas desse público que hoje tem um poder de compra bem maior do que há alguns anos — fez com que o varejo, setor que já vinha crescendo em conta da estabilidade econômica e do aumento do crédito, aumentasse ainda mais suas vendas. A web, aliás, virou um grande facilitador para os consumidores, seja pelo também aumento do e-commerce, que nos últimos tem crescido com taxas superiores de 20% ao ano, ou mesmo pela facilidade de comparação dos preços.
Hoje, boa parte das pessoas sai de casa já sabendo o que e onde comprar, o que também tem provocado mudanças na forma dos varejistas se comunicarem. “Antes da compra online, os critérios básicos para o sucesso de uma campanha de varejo eram atenção, interesse, desejo e ação. Pós-web, passaram a ser atenção, interesse, desejo, consulta, ação e disseminação”, comenta Reinaldo Lopes, sócio-diretor da Escala, agência que desde os anos 70 criou uma expertise no atendimento a clientes de varejo. “O varejista que não estiver preocupado com consulta e disseminação está morto. Antes falávamos em propaganda on e offline. Hoje é uma coisa só, onde o mundo offline desperta atenção, interesse e desejo e, o online, a consulta e disseminação. Cada macaco no seu galho, mas todos juntos”.
Segundo Lopes, o varejo exige senso de urgência, enquanto a propaganda depende da sedução. “E é muito complicado unir urgência e sedução em um trabalho. Se a agência pender muito para um lado, perde do outro. Tem clientes que podem fazer isso. Veja as Casas Bahia. Com suas tradicionais chamadas ‘gritadas’, eles perdem em sedução, mas são compensados por trabalhar a urgência com uma capacidade fantástica. Ou seja, acharam a relação custo-benefício de forma correta”, diz.
O publicitário diz que os 11 shoppings da Sonae Sierra Brasil são bons exemplos onde a agência consegue unir urgência a sedução. “Temos duas grandes liquidações anuais, que chamamos de Código Verde, que pedem senso de urgência. E não é fácil associar um shopping, que é um ambiente mais sofisticado, a uma liquidação. E temos conseguido fazer isso com os nossos trabalhos”. Na última liquidação, em agosto passado, a Escala transformou os consumidores em protagonistas da campanha, dando a eles a chance de escolher por quais produtos queriam pagar menos.

Qualidade
Cco e coo da Publicis Brasil, Salles Chemistri (agência especializada em varejo) e Publicis Dialog, Hugo Rodrigues despontou para a publicidade criando para o varejo, especialmente para a Chevrolet. “A propaganda de varejo de qualidade sempre vendeu e até ganhou prêmios. O trabalho que fazemos há muitos anos para GM é prova disso. A diferença é que mesmo nessa condição, antes ela era o patinho feio da publicidade. Hoje é o cisne”, analisa.
O criativo diz que hoje as agências lutam arduamente para conquistar clientes do setor, principalmente pela evolução da internet. “O digital começou a ser mensurado. E a propaganda de varejo sempre trabalhou com mensuração. E de forma prática: colocou no ar e não encheu a loja no dia seguinte? Muda tudo!”. Rodrigues diz que não existe segredo em criar para o meio. Baste ser direto. “Também ajuda ter vivido por situações que a classe média passa, pois no planejamento da comunicação é preciso estudar, observar e, principalmente, respeitar as opções desses consumidores. Se você achar que seu gosto pode prevalecer em um filme varejista, pode se dar muito mal. Faço uma analogia com o cinema: nem sempre a maior bilheteria condiz com o filme que é melhor recebido pela crítica” diz, alertando para outra nuance: que a classe C quer ser informar e se instruir, mas ainda tem vergonha de perguntar. “Mas comparam. Vão ao Buscapé (maior site de comparação de preços do país) e pesquisam os preços. Hoje temos uma 25 de março na tela”, diz, em alusão à rua mais movimentada do comércio popular paulistano.
O publicitário também diz que é possível construir marca no varejo, e não apenas vender. “A maior rede varejista do mundo, o Walmart, foi construído com publicidade. A GM também é líder em São Paulo, maior mercado da América Latina, também com o varejo”.
Diretor de inteligência de mercado da Y&R, agência que detém a conta das Casas Bahia — anunciante líder em investimento publicitário no Brasil —, Cesar Ortiz também diz que hoje a propaganda para o meio está muito mais integrada com a construção de marca do que com a “velha comunicação de preço, aliada à urgência”. “Não se faz mais varejo sem mensagem alinhada com a marca. A era do ‘call to action’ já passou”, diz.
Para ele, a comunicação tem que gerar desejo, e não o senso de oportunidade. Até porque a tecnologia propicia que existam outros meios para que o consumidor faça suas escolhas e pesquise os preços. “Este fenômeno está fazendo até com que as empresas de varejo mudem a maneira de distribuir suas verbas publicitárias. Estão direcionando mais dinheiro para a propaganda institucional”, diz, deixando claro que não está questionando a importância de comunicar o preço em certas ocasiões. “É importante, claro. Desde que, repito, alinhado ao DNA da marca. Quando um grande varejista como as Casas Bahia anuncia um colchão com preço baixo, não quer dizer exatamente que é para o consumidor sair de casa correndo para comprá-lo, mas sim que a loja costuma ter produtos com melhores preços e prazos. Está sim vendendo sua marca, não apenas um produto”, completa.
Contraponto
Nem para todos a propaganda de varejo passa por seus melhores dia. Alcir Gomes Leite, coo da DM9DDB, diz que as marcas continuam sim batendo nas teclas “preço, prazo e condição de pagamento”. “E é algo que me incomoda muito. O mercado evoluiu, o consumidor faz comparações e escolhe seus produtos em 10 minutos, com alguns toques no teclado e sem se mexer da cadeira, e muitos varejistas continuam a gritar em seus ouvidos”, diz.

Para Leite, este tipo de propaganda subestima o crescimento e a capacidade de escolha dos consumidores. “Temos que comunicar preço e prazo, mas não da forma ofensiva como é feita. O varejo pode e deve ser planejado. A gestão de marca tem que ser levada em conta. O varejo não é feira livre”, afirma, citando como contraponto o trabalho realizado pela DM9 para a C&A. Um deles é a ação “Fashion like”, que fez o processo inverso das campanhas integradas ao Facebook. Ao invés da ação acontecer na rede social, foi realizada nas lojas físicas, com mostradores digitais nos cabides contando o número de “likes” que a marca recebe na mídia social. “E a C&A também é uma rede voltada para a classe média, como tantas outras que estão mais preocupadas em comunicar preço”.



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