Documento ainda não foi homologado pelo Ministério Público, mas motiva queixa
Quase oito meses depois de ser assinado por representantes do
Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi-SP) e do Ministério Público
do Estado (MP-SP), em 26 de setembro, o Termo de Compromisso de
Ajustamento de Conduta (TAC) que balizaria os procedimentos no mercado
nos casos de atraso para a entrega de obras ainda não tem validade. O
documento deveria ser homologado pelo Conselho Superior do MP (CSMP) em
120 dias, o que, até hoje, não ocorreu.
Em nota, o MP-SP informa que o TAC ainda está sob análise do
CSMP, sem previsão de entrar em pauta. O presidente do Conselho Jurídico
do Secovi-SP, Carlos Del Mar, diz que apenas acompanha o andamento do
processo, na dependência de uma ação do MP. "O que pode explicar um
pouco essa demora, além de uma tramitação normal, é que houve as
mudanças do procurador-geral e do conselho superior do Ministério
Público."
Com ou sem homologação, o TAC está longe de ser uma
unanimidade. Alguns especialistas em direito imobiliário e
representantes do setor questionam os termos do acordo. O documento
exige das empresas do setor a notificação dos clientes 120 dias antes do
atraso e prevê algumas punições: 2% sobre o valor pago pelo consumidor
acrescidos de 0,5% sobre o mesmo valor a cada mês de descumprimento de
prazo estipulado em contrato.
Reclamação. "É (oTAC)um tremendo retrocesso
para o consumidor e para as relações de consumo", diz o especialista em
direito imobiliário Marcelo Tapai, do escritório Tapai Advogados.
Suas razões de descontentamento decorrem da seguinte
avaliação: em um imóvel de R$ 200 mil, o comprador arcaria em média com
30% do valor durante a etapa de obras, totalizando R$ 60 mil. Pelas
regras do TAC, ele teria direito a uma compensação de R$ 1,2 mil (2%) e
R$ 300 a cada mês de atraso (0,5%). "O valor não dá para nada. A bolsa
moradia da Prefeitura é de R$ 350."
Segundo ele, é comum, durante a construção, o prolongamento
da incidência do Índice Nacional da Construção Civil (INCC) sobre o
saldo devedor. No exemplo citado, a dívida do comprador cresceria R$ 714
ao mês, levando-se em conta o INCC de 0,51%, registrado em março. "É um
negócio bizarro", diz Tapai.
Decisões atuais da Justiça parecem mais vantajosas ao
consumidor. Proposta há um ano contra a incorporadora PDG pelo atraso de
dez meses na entrega do empreendimento Exuberance, no Jardim
Bonfiglioli, uma ação movida por Cristiano Rogério Bamont, de 40 anos, e
sua mulher, Aline Morilla Bamont, de 34, teve como resultado a
condenação em primeira instância da empresa ao pagamento de mais R$ 108
mil aos reclamantes.
Além de danos morais, a decisão incluiu multa de R$ 4,5 mil
mensais aplicados de março a dezembro de 2010 - equivalente a 1% do
valor total da unidade. O montante seria equivalente a um aluguel bem
rentável.
"Vendemos nosso apartamento em 2009 com toda a mobília e
fomos morar num flat esperando a entrega, que seria em fevereiro", diz
Aline. Com o atraso, eles pretendiam continuar no residencial alugado,
mas não puderam, porque o imóvel foi vendido, e o novo dono decidiu não
manter o vínculo. "Ninguém queria alugar para gente por quase um ano",
conta.
A PDG informou em nota ter recorrido da decisão. Segundo a
empresa, o Habite-se do empreendimento foi expedido em agosto de 2010,
dentro do prazo de carência de seis meses. "Nossos contratos de venda
para este empreendimento preveem multa contratual para os clientes após a
carência, mas neste caso não há a aplicação."
Para o presidente do Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa
das Relações de Consumo (Ibedec), José Geraldo Tardin, a homologação do
TAC pelo MP pode comprometer proposituras desse tipo no Judiciário. Ele
também considera positivo o estabelecimento de multas, mas acha dilatado
o prazo de tolerância de seis meses para a entrega.
"Se o consumidor atrasar suas parcelas por três meses, a
construtora já tem o direito de retomar o imóvel. O grande problema é
que construtoras de má-fé já na venda prometem entrega em um prazo que
sabem que não irão cumprir", diz.
O presidente do Sindicato da Construção (Sinduscon-SP),
Sérgio Watanabe, reconhece o teor de orientação no documento, mas tem
reservas ao seu caráter coercitivo. "Não devemos utilizar o TAC para
punir. Temos legislação vigente para isso."
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