Ronaldo, o homem de negócios

Depois de 18 anos nos gramados, o Fenômeno completa dez meses como sócio presidente da 9ine e fala sobre sua experiência à frente da agência

(*) Depois de 18 anos como profissional do futebol, Ronaldo Nazário completa pouco mais de dez meses como empresário da propaganda. Aos 35 anos, o Fenômeno é sócio presidente da 9ine, agência que traz também “esporte e entretenimento” no nome.

Ronaldo detém 45% das ações da empresa, mesma participação do Grupo WPP –10% estão com Marcus Buaiz, diretor-executivo –, conta que tem muito que aprender. Por isso, prepara-se para passar um ano na Inglaterra seguindo os ensinamentos de Martin Sorrell, CEO da holding.

Mas o universo da publicidade não é novidade para o ex-jogador, que esteve em quatro Copas, tornando-se o maior artilheiro do Mundial e sagrando-se campeão em duas. Habituado a ser garoto-propaganda de diversas marcas e discutir os termos de seus contratos, Ronaldo exerce agora seu lado de homem de negócios acompanhando discussões, concorrências e apresentações.

Em papo com a TV Meio&Mensagem, Ronaldo conta como estão os primeiros passos da 9ine (veja no final da página). A entrevista completa você confere na edição nº 1483 de Meio & Mensagem, que circula com data de capa de 31 de outubro de 2011.

* Colaborou Renato Pezzotti (rpezzotti@grupomm.com.br)

Veja:

Meio & Mensagem ›› Após 18 anos de futebol profissional, quando sentiu que era hora de se tornar um homem de negócios? Você fez um negócio diferente dos demais ex-atletas. Como veio essa ideia? 

Ronaldo Nazário ›› A gente estava programando a 9ine em julho do ano passado, numa pizza na casa do Faustão, conversando com ele, Sérgio Amado (presidente do Grupo Ogilvy), Musa (Luiz Fernando Musa, CEO da Ogilvy) e o Buaiz (Marcus Buaiz, outro sócio da agência). O Fausto teve a ideia de criar uma agência voltada ao esporte, algo meio carente no mercado. O programado era que fizéssemos isso quando eu encerrasse a carreira. Como eu antecipei a minha parada, a gente acelerou o processo da criação. Deu no que deu. E eu também não tinha pensado em fazer o que a grande maioria dos jogadores faz, tipo cuidar de atleta... 

Meio & Mensagem ›› Você falou de aprender. Você já passou um tempo na Inglaterra para estudar publicidade? 

Ronaldo Nazário ›› Ainda não. Vou passar. A partir de março do ano que vem pretendo ficar um ano na Inglaterra estudando publicidade e inglês.  

M&M ›› Fazer ONG... 

Ronaldo ›› ONG é um projeto que tenho. A criação foi junto com a 9ine, em fevereiro. A ONG também é diferente das que já existem. A minha, chamada Criando Fenômenos, não tem uma estrutura física. Ela será uma fundação que vai captar recursos. Vamos fazer auditoria em algumas outras já existentes. E, a partir disso, vamos destinar os recursos para uma fundação ou outra.  

M&M ›› Seria mais para orientar o investimento das empresas interessadas? 

Ronaldo ›› A gente vai captar e investir nas instituições que trabalham direito. A gente analisa uma fundação X, vê se ela trabalha direito, se os números batem, se o que entra é investido. Verifica se é séria. De acordo com sua necessidade, a gente faz essa ponte com nossos recursos. Eu já destino uma parte da minha receita de imagem para minha fundação.  

M&M ›› Como é o modelo de atuação da 9ine?  

Ronaldo ›› Atuamos de acordo com a exigência do cliente. A agência é preparada para fazer tudo. Lógico que temos a especialidade maior no esporte, mas somos uma agência de publicidade.  

M&M ›› Você sempre foi garoto-propaganda, desde os 18 anos, quando acertou com a Ambev. Tinha relacionamento direito com os contratos dos patrocinadores ou isso ficava com o seu agente? 

Ronaldo ›› Sempre tive contato com as pessoas que cuidavam da marca e que lidavam comigo. Estou agora no mercado de publicidade, mas isso não é totalmente novo para mim. Administrei minha carreira e o relacionamento com os clientes por muito tempo. 

M&M ›› Hoje, como garoto-propaganda, você tem contrato com Ambev, Claro, Hypermarcas, Nike... 

Ronaldo ›› ...Duracell, que foi em junho (e que tem duração de três anos). E Extra. A gente anunciou a concorrência que ganhamos de ativação do patrocínio com a seleção brasileira. Eu também serei garoto-propaganda. Ainda não fiz a ação, mas temos esse acordo. 

M&M ›› Como se divide seu papel como garoto-propaganda e presidente da agência? Tem isso de a marca fechar com a 9ine desde que o garoto-propaganda seja você? 

Ronaldo ›› Não é obrigatório. A gente deixa isso claro para o cliente: tem que pagar a mais para eu ser o garoto-propaganda (risos). Há pagamentos distintos: eu negocio a minha imagem e a gente negocia o fee da agência, de acordo com o trabalho que vai ser feito. 

M&M ›› O que você conhecia do mercado de propaganda?  

Ronaldo ›› Já sabia mais ou menos. Tive muito contato também com o Nizan (Guanaes, chairman do Grupo ABC), que fez muita campanha comigo. Já entendia um pouquinho desse universo e agora estou aprendendo ainda mais. Toda a disputa pelo mercado, isso é interessante demais. Na época de concorrência, o ambiente é muito bom. A galera se estimula muito mais, quando tem um objetivo, um prazo, uma entrega. É bacana. Fiquei muitas vezes, acompanhando. Fui pessoalmente ao cliente no dia da apresentação de alguns projetos. Outras apresentações nós fizemos aqui, na agência. 

M&M ›› Já decidiu onde estudar? 

Ronaldo ›› Vou para Londres estudar com Martin Sorrell (CEO do Grupo WPP). Não é em uma faculdade. Vou ficar no pé dele, vou encher o saco dele o dia todo (risos). Como um zagueirão. Mas ele viaja muito. Não vai ser sempre que estarei com ele. Quando ele estiver em Londres, vai ter de me contar tudo.  

M&M ›› Vai acompanhar negociações? 

Ronaldo ›› Eu quero aprender. Estou muito a fim. E tenho um espaço no cérebro precisando de conteúdo. Quero aprender muito. No futebol a gente se dedica muito. Tem treino todo dia, viagem no fim de semana. Então, você vê: 18 anos se passaram e eu mal estudei. Tenho necessidade de estudar. Aprendi muito na vida, viajando, morando fora, com a escola da vida mesmo. Mas tenho de me aprofundar também em alguma coisa. Agora vai ser perfeito. 

M&M ›› Você já esteve em algum Festival de Cannes? 

Ronaldo ›› O Martin me convidou no início do mês passado e eu confirmei que irei para o Festival ano que vem. Provavelmente participarei do debate dele. Ainda não sei. Vou para Cannes ano que vem e quero ver absolutamente tudo. Vamos ver se como agência a gente estará lá também. Quem sabe um prêmio. 

M&M ›› Quais são as metas para os próximos cinco anos? Que números pode revelar? 

Ronaldo ›› Posso adiantar só que neste ano a gente já está no lucro. Batemos os custos que tivemos e já estamos ganhando.  

M&M ›› Quanto à organização da Copa, o que merece bastante atenção?  

Ronaldo ›› Tudo. As pessoas têm falado muito sobre o dinheiro público e seu controle. Mas é um evento tão importante e com investimentos tão altos que toda a população sai ganhando. Há um legado social com os investimentos que estão sendo feitos. Isso é maravilhoso para o País. Só gostaria de tirar minha dúvida a respeito da participação de cada um dos envolvidos na Copa. Queria que ficasse clara essa participação: da Fifa, do governo federal, da CBF. Essa distribuição de responsabilidades ainda não está clara para a população. O povo precisa dessa informação.  

M&M ›› Há coisas sobre a Lei da Copa que estão em discussão. Na hora de perguntar algo fica difícil saber com quem falar... 

Ronaldo ›› Eu também não sei. É isso que a gente quer enquanto povo. Saber exatamente o que, quem manda, quem deixa de fazer. Faço parte do Comitê da Copa de São Paulo. Estou lá mais pela minha experiência como jogador. Estive em quatro Copas do Mundo. Na minha primeira reunião com o governador e com a equipe do Comitê, uma das minhas ideias é que Copa não fosse apenas os jogos de futebol em si. A cidade que recebe os jogos tem que oferecer muito mais lazer e entretenimento. Na partida cabem 60 mil pessoas. Mas pensar nisso (nesse número de pessoas) é pouco para o que São Paulo pode oferecer. São Paulo tem de ter muito entretenimento. O transporte tem de ser incrível. O turismo tem de ser incrível. 

M&M ›› Passou outras ideias para o Comitê? Falando de transporte, por exemplo, na abertura do Pan de Guadalajara isso funcionou bem. 

Ronaldo ›› Na época dos grandes eventos sempre funciona. As pessoas fazem acesso especial, fecham ruas. Vai funcionar. Mas eu digo que é preciso algo para o povo mesmo. Minha família foi a todas as Copas. Quando não tinha jogo, não tinha muito a fazer. Como foi na Coreia. Em 1998, Paris oferece milhares de oportunidades, de turismo, lazer. Todas as cidades têm de oferecer muito entretenimento. Todas as prefeituras têm de se envolver.  

M&M ›› A 9ine toma conta da imagem da carreira do Neymar, do Lucas, do Falcão no futsal, e mais atletas do skate e surf, além do Anderson Silva. Você teve uma carreira longa, com cases de sucesso e até com alguns problemas com patrocinadores, com histórias e escândalos que geraram uma discussão de quebra de contrato. Como essa experiência ajuda a orientar a carreira desses atletas?  

Ronaldo ›› Eu não tive nenhum contrato quebrado. Tive contratos não renovados. Isso é direito da empresa.  

M&M ›› Em um dos casos, você arranjou um contrato até melhor... 

Ronaldo ›› Isso sim. Mas eu aconselho e a gente tenta fazer isso na 9ine. Com o Neymar é uma história a parte. A gente prefere sempre fazer poucos contratos e duradouros. Têm de ser poucos, mas importantes. Temos um pouco de dificuldade porque não temos autonomia máxima com ele. O Santos divide essa tarefa conosco por ter o direito federativo e o direito de uma parte da imagem. Então, não é 100% trabalho da 9ine essa administração da imagem do Neymar, o que gostaríamos muito de ter. Ele é um talento muito grande e é um garoto muito carismático. Tenho certeza de que poderíamos fazer melhor do que está sendo feito.  

M&M ›› Já que você está no mundo da propaganda, há instituições, grupos e projetos de lei que visam criar regras para a comunicação de produtos para crianças. Há discussões também em torno de ações feitas pelas marcas de bebidas alcoólicas. E debates em defesa da liberdade de expressão comercial. Como analisa questões como essas? 

Ronaldo ›› Tenho filhos e eles vão participar comigo de um comercial de Duracell. Não vejo problemas nesse tipo de participação. No caso das bebidas alcoólicas, acho que é preciso tomar muito cuidado. Tudo tem de ser discutido. Há vários tipos de comparações a fazer. O fast-food é um caso. O mundo nunca foi tão obeso quanto está agora. As empresas de fast-food talvez sejam as que mais investem em propaganda. Mas tem de ser discutido com seriedade e as leis têm de ser muito claras, sem criar brechas para interpretações. 

M&M ›› No Pan de Guadalajara, a cerveja era liberada nos estádios. 

Ronaldo ›› Houve um problema com uma campanha de Brahma que fiz. Como minha imagem é também muito ligada à criançada, tivemos problemas com um promotor pedindo para tirar o comercial do ar. As coisas não são muito claras, nem mesmo na legislação. Fica muito na interpretação de cada um. Falar de bebida no estádio é como falar de bebida no Carnaval, na Sapucaí, em shows. Tudo é entretenimento, só que há visões diferentes.  

M&M ›› Como você viu a conclusão do episódio do Rafinha Bastos? 

Ronaldo ›› Não tenho participação nenhuma nem nada a ver com esse assunto. Mas sofri como todo brasileiro com tamanha grosseria que ele disse. A Bandeirantes teve um comportamento sensacional. Ele passou completamente dos limites. E continua passando e está se escorando na lei de liberdade de expressão, o que acho que não tem nada a ver com o caso.  

M&M ›› Você já foi alvo de muitas piadas, principalmente na época da saída do Flamengo. Já pensou em processar alguém? 

Ronaldo ›› A vida toda fui alvo. Foram poucos segundos em que pensei (em processar). Sou forte. Minhas costas são largas. E eu aguento. Mas nunca faltei com respeito. Esse episódio ultrapassa todos os limites do respeito. Essa é minha opinião, de quem não tem nada a ver com isso. Eu sou amigo do Buaiz, mas é minha opinião de indignação. Todo mundo erra na vida. Mas a pessoa não percebeu o próprio erro. Isso foi outro erro.