segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Mercado debate Critério Brasil

Críticos questionam metodologia, afirmando que estudo não acompanha mudanças de hábito de consumo da população


Principal ferramenta nas pesquisas para definição do bolo publicitário, o Critério de Classificação Econômica Brasil (CCEB), ou Critério Brasil, elaborado pela Abep (Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa), enfrenta polêmicas. Entre as críticas, diz-se que não acompanha as mudanças e os hábitos de consumo da população. E questiona-se a metodologia, que analisa itens de conforto e nível escolar do chefe de família.

“O critério conta com questões não resolvidas. Não aborda os impactos do consumo na sociedade”, exemplifica Renato Meirelles, sócio-diretor do Data Popular. “Quando você pega o número de banheiros, por exemplo, pode não refletir a classe social na medida que você tem ricos morando em lofts ou em apartamentos de um quarto”. O critério, para distinguir classes sociais, usa perguntas sobre o número de televisores, rádios, banheiros e empregados domésticos mensalistas; posse de máquina de lavar, geladeira e/ou freezer, vídeo cassete e/ou DVD e nível de instrução do chefe da família.


Guilherme Caldas, diretor da ABA Rio (Associação Brasileira de Anunciantes) e gerente  de marketing e operações da Michelin na América do Sul, acredita que o índice é válido e representativo. Prevê, no entanto, que a mobilidade social e de hábitos vão exigir uma análise profunda da ferramenta em curto intervalo. “A população está mudando radicalmente. Temos muitas famílias com apenas duas pessoas. Então, falar em números de televisores ou de carros pode gerar talvez uma classificação equivocada de uma família que seria A1. Este, para mim, é o principal ponto”. Para Meirelles, do Data Popular, isso prejudicaria o mercado anunciante, que pode acabar falando com um público quando projetava impactar outro.


O CB recebe críticas também por não ter em sua lista itens como computadores e celulares. Segundo Fernando Leite Ribeiro, vice-presidente da Abep, isso ocorre porque o critério atua com itens que representam poder quando se fala de renda. “Trabalhamos com itens consolidados no consumo brasileiro. Tablet, por exemplo, não discrimina, não correlaciona com renda”, diz. Para ele, como o critério é para todo o País, é preciso cuidado com a nacionalização de impressões locais. “No dia em que todas as pessoas tiverem o mesmo número de rádios, ele desaparecerá. Precisamos de itens que separem”, explica.


O executivo da Abep reitera que o critério atende ao que se propõe. “Se começarmos a aumentar o questionário, daqui a pouco fica impraticável. O critério é bom. Não há porque questioná-lo neste momento”, diz. Meirelles, do Data Popular, defende outra análise, por renda domiciliar per capita, embora reconheça a validade do CB e o seu histórico de pesquisa. “Pelo nosso convívio com os anunciantes, pelas pesquisas que estamos realizando, pela dispersão que a posse de bens tem na classe C e pela mudança de configuração da família brasileira, nós achamos por bem sugerir um critério que possa possibilitar aos anunciantes entenderem realmente quem é de cada classe social no Brasil e também o uso de dados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares) e do Censo para extrapolar as pesquisas ad hoc realizadas pelos anunciantes”.


Por outro lado, a Abep argumenta que o critério responde às demandas. “A marca fala com o nível social que ela quer falar. Mas não fala com o público específico que a interessa. O Critério Brasil pode e deve ser complementado pelo anunciante”, afirma Ribeiro. Segundo ele, o modelo ora proposto é “bom, mas tem tantos problemas quanto este, pois nenhum dos dois critérios define a sociedade de forma homogênea”. Complementa ainda que o CB tem pouco poder de diagnóstico quando se analisa indivíduos. E que são nas simplificações que “acontecem as críticas à ferramenta de análise”.


Caldas, da ABA Rio e também professor da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) e da FGV (Fundação Getulio Vargas), vê um problema na classificação por renda: “As pessoas não falam a verdade”. De acordo com o executivo, esta pergunta induz a inverdades. “Não sei se este erro não é maior do que o do Critério Brasil”. Fora que ainda há um terreno  nebuloso, com pessoas que trabalham informalmente e não sabem quanto ganham. O momento, porém, pressupõe debate. “Tem que ter discussão mais ampla. Será que a estrutura que temos hoje poderá continuar nos próximos 10 anos?”, indagou.


Para Caldas, o CB precisa avançar e fazer mais ajustes. “Talvez não faça sentido daqui a pouco tempo colocar TV em cores, mas sim TV de plasma ou LCD”. Entre as deficiências do Critério Brasil, o professor cita ausência de contato com as classes altas. “Muitas das empresas voltadas para a classe A não usam o critério. Têm outras formas de chegar lá. Quando você quer fazer a quebra do crème de la crème o critério Brasil não ajuda”, diz.


Presidente da Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap), Luiz Lara diz que a base para a pesquisa independe, em um cenário que exige análises pragmáticas sobre a evolução em curso e pela necessidade de outros instrumentos. “As agências usam esses parâmetros mas também compram as suas pesquisas de mídia porque o fato é que nós não podemos mais planejar uma estratégia só com dados de classificação socioeconômica ou mesmo de posse. Nós temos que nos aprofundar mais em pesquisas que analisem hábitos e atitudes de consumo porque, na verdade, hoje cada vez mais nos utilizamos da plataforma de mídia para criar estratégia segmentada de comunicação”.


por Marcos Bonfim

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