segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Bem aplicado

Os amigos Luiz Menezes e Bruno Machado decidiram deixar a empresa em que trabalhavam como desenvolvedores, a CI&T, quando já tiravam uma receita de quase US$ 10 mil mensais com os aplicativos que vendiam na App Store criados nas horas vagas, depois do expediente.

A empresa, que também cria aplicativos para grandes companhias, não deixou. E para não perder os recém-empreendedores, propôs uma parceira para que criassem seu próprio negócio usando a infraestrutura do lugar. “É como uma empresa incubada”, diz Menezes, de 33 anos.
Desde o início do ano, é assim que eles trabalham com uma equipe de outras quatro pessoas. Depois de criar o game Smelly Cat, agora a Ipanema Games, como batizaram o empreendimento, se prepara para lançar, no dia 15, o jogo Time for Epic.
Ambos os games são gratuitos, e a receita vem de anúncios, de fases e itens virtuais vendidos dentro dos games, além de uma versão sem publicidade. O Smelly Cat, lançado em julho, teve 400 mil downloads na loja de aplicativos da Apple, 70 mil deles no Brasil. No ano que vem, o projeto é adaptar os jogos aos celulares e tablets Android.
“Tem bastante gente fazendo aplicativo por conta própria e coisa boa. E gente ganhando dinheiro. Você começa assim, ganhando US$ 500 por mês. Aí faz o segundo jogo e ganha US$ 700. Faz o terceiro, já dá US$ 1.500”, explica Menezes.
É esse tipo de visão que tem atraído diversos desenvolvedores no País a criar um negócio próprio, apostando no rápido crescimento dos smartphones no mundo e no Brasil. Durante o primeiro semestre, as vendas de aparelhos do tipo aumentaram 165% de acordo com o instituto Nielsen, comparado aos primeiros seis meses de 2010. Apesar do crescimento, apenas 5,8% dos celulares vendidos no Brasil são smartphones, o que demonstra que ainda há muito espaço para quem pretende viver do desenvolvimento de aplicativos.
Existem bastante projetos que envolvem a criação de games e novas empresas já mais estabelecidas como a Best Cool Fan Games (mais informações abaixo), mas outras ideias também têm recebido investimentos para levar as ideias inovadoras adiante.
“São poucas oportunidades de investimento no Brasil, mas as empresas estão começando agora a investir em negócios menores. Então as startups estão se profissionalizando mais”, conta o engenheiro da computação Bruno Lopes, de 25 anos, um dos quatro sócios da empresa que criou o aplicativo Meu Carrinho.
Em agosto, eles foram um dos quatro vencedores do prêmio Sua Ideia Vale Um Milhão, promovido pelo BuscaPé, e receberam R$ 300 mil para ampliar o negócio. No aplicativo, por enquanto disponível apenas para Android, é possível fazer consultas de preços de produtos encontrados em supermercados e montar listas de compras.
A ideia surgiu para fazer um comparador de preços de supermercado na internet. Depois, eles criaram o programa para celular. A base de dados do BuscaPé vai ajudar a incrementar a busca de produtos em uma nova versão do Meu Carrinho, que será lançada “daqui um mês, um mês e meio”, segundo Lopes, junto da versão para iPhone.
O empreendedor Gustavo Marquini, sócio da Mobwise, é outro que aposta no desenvolvimento de um serviço dedicado a celulares. Sua empresa tem o objetivo de criar soluções para a mobilidade urbana e está criando o aplicativo Wabbers, que pretende informar a situação do trânsito cruzando informações de radares de fiscalização, rastreadores de veículos e de informações enviadas pelos próprios usuários que utilizam o app.
“Nos próximos seis meses, a tecnologia deve estar adaptada a São Paulo”, conta Marquini, explicando que o projeto começou traçando o trânsito de Campinas. O aplicativo ficou em terceiro lugar do prêmio do StartupFarm, maratona de desenvolvimento para startups que ocorreu entre agosto e setembro.
Incentivos. É para promover projetos assim que o empresário Bob Wollheim, um dos criadores da produtora YouPix, está fundando a Appies, segundo ele, uma espécie de espaço para ajudar desenvolvedores a planejar modelos de negócios para seus projetos de aplicativos, além de opinar sobre o design e ajudar na divulgação dos programas para celular.
Com investimento inicial de R$ 500 mil, Wollheim montou a Appies no primeiro andar de um prédio da Avenida Faria Lima, com bancadas simples e móveis do antigo inquilino. Ele espera que a partir de 2012, os desenvolvedores possam usar o espaço para trabalhar, fazer reuniões e eventos. Os melhores projetos, do que ele chama de “geek economy” (economia geek), serão selecionados e podem receber investimento direto dos fundadores da Appies. O sócio de Wollheim é o investidor Pierre Schürmann. “A geek economy permite que você seja um desenvolvedor e se complemente com um monte de coisas que alguma empresa vai fazer para você. Quando a gente percebeu isso, viu que esses caras precisam de negócio, visão de negócio”, disse Wollheim. É essa visão que ele pretende passar a programadores que participarem do projeto.
O gestor de TI do Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia (Cietec), Franco Lazzuri, afirma que mesmo desenvolvedores bons falham por não ter estratégia de divulgação na hora do lançamento e, na incubadora, trabalha também esse lado com empreendedores de aplicativos.
“Tem desenvolvedores brasileiros independentes, ou mesmo grandes softwarehouses, que, quando lançam a versão 1.0, não dão certo. Aí fazem uma pequena modificação, mudam a estratégia de comuncação e o negócio vira uma mania internacional”, diz Lazzuri. “O difícil é se projetar nas redes, selecionar a janela de lançamento. Tem jogos que deixam o queixo no chão e ninguém nunca ouviu falar.” / FILIPE SERRANO
De hobby a empresa modelo de games
Guilherme Schvartsman, de 24 anos, juntou R$ 10 mil durante os 12 meses em que estagiou em um grande banco de investimento em São Paulo em 2009. Continuar na empresa poderia lhe render ainda mais dinheiro, mas ele preferiu investir parte da poupança no seu hobby: games para smartphones.
Com um computador e muita disposição para aprender sozinho a programar aplicativos, ele fundou em abril de 2010 a Best Cool & Fun Games, hoje a maior da América Latina na área de games e aplicativos. Bunny Shooter, jogo em que o usuário mata coelhos, estreou no Android Market no mês passado e teve 5 milhões de downloads. Em 30 dias, ele foi o segundo jogo mais baixado da loja de aplicativos. Só perdeu para Angry Birds.
Também está entre os hits do Android Market e da AppStore o primeiro game de sucesso da startup, Ant Smasher. Com a simples proposta de esmagar formiguinhas que passeiam pelo celular, o jogo conseguiu 15 milhões de downloads e gerou receita de US$ 2 milhões em 2010.
Chegar a esse resultado exige, segundo Guilherme, desapego emocional em relação aos games criados. Sua empresa jogou no lixo 95% dos aplicativos criados pela equipe. “Se o produto deu sinal de que não vai para frente, o melhor é enterrá-lo. Aliás, falhar rapidamente tem o seu mérito.”
A dica do jovem empreendedor é diferente da realidade brasileira, em que um erro tem sabor de derrota. Se nos Estados Unidos o fracasso vira cicatriz, aqui a tendência é abaixar a cabeça.
“Essa cultura punitiva deve ser modificada”, diz Daniel Cunha, cofundador da Initial Capital, que investe em jovens empresas israelenses e brasileiras. “O próprio investidor sabe que a startup errará muito no início.”
Lucro. Apesar de a Best Cool & Fun Games estar voltada ao entretenimento, o fundador lembra: buscar o lucro é assunto levado muito a sério. Hoje, 95% da receita vem de propagandas e da venda de itens virtuais. O modo “Kids”, no qual o usuário nunca perde, custa US$ 5.
E novas formas de ganhar dinheiro também entram no processo criativo. Há um mês, a empresa colocou no ar uma plataforma em que o próprio anunciante coloca seu anúncio nos games da Best e de uma rede de parceiros pelo preço de US$ 1 por usuário. É a primeira empresa a fazer esse tipo de serviço no Brasil.
Fundos. Estratégias como essa atraem grandes olhos. Além do investimento do fundo brasileiro Arpex, a Best recebeu dinheiro da companhia americana de private-equity Madrone e de Yuri Milner, o mesmo investidor do Facebook.
A empresa tem agora 30 jogos, em sete idiomas. Todos produzidos em São Paulo. Mas o ganha- pão não vem da audiência verde-amarela. Dos cerca de 20 milhões de usuários ativos por mês, apenas 3% são brasileiros. Os americanos respondem por 60%, e o resto dos gamers estão espalhados, principalmente, pela Europa.

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