Impressiona a leveza com que a
Editora Abril faz revistas. Basta um piscar de olhos e ela já tem um
novo título na rua. Se emplacar, mantém. Se não emplacar, fecha. É comum
encontrarmos nas salas de espera dos consultórios médicos ou dos
dentistas algum título novo, que nem sonhávamos existir. A “arvorezinha”
está lá como que atestando a flexibilidade editorial e industrial da
Abril.
A Abril foi uma das empresas que tentaram comprar o jornal Gazeta
Mercantil, que começava a derreter com a crise que o atingiu em 2001 e
seria responsável pelo seu fechamento em 2009. Se a transação tivesse
ocorrido, representaria a entrada da Abril no mundo dos jornais. Será
que conseguiria fazer jornal com a mesma leveza com que faz revistas? O
mundo dos jornais precisa aprender a fazer jornal com mais simplicidade,
a exemplo do que fazem os japoneses.
Nos anos 1990, o Estado de S.Paulo descobriu o segredo dos japoneses em
produzir jornais interessantes e a custos reduzidos. Eu mesmo estive
lá, na Nikkei, em Tóquio, como enviado da Agência Estado, para aprender
como era possível editar vários títulos com base num único conteúdo. Fiz
um relato do que vi para as redações do Estadão e do Jornal da Tarde.
Os japoneses influenciaram mudanças e talvez tenham dado uma sobrevida
de vários anos ao Jornal da Tarde, mas as operações para editar dois
jornais continuaram pesadas, resfolegantes.
A dificuldade de fazer dois jornais
Os japoneses já haviam conceituado: para eles, a informação é o
“peixe”; o “pescador” é o repórter. Ao ser fisgado, o peixe nunca vai
direto para o supermercado (redação). Passa antes pelo que chamam de
“câmara frigorífica” – um bureau de captação de informações – onde é
processado. Devidamente retalhado, o “peixe” é então despachado para as
redações – escama para quem usa escama; cabeça para quem usa cabeça;
filé para quem usa filé.
O “bureau de captação” tal qual vi em funcionamento na Nikkei era
independente, alimentava todas as redações, que eram pequenas, enxutas,
tinham apenas um corpo de editores e um ou outro articulista
especializado ou repórter especial. Dentro desse modelo, a Nikkei
produzia 16 jornais na época, fora serviços informativos em tempo real. O
custo operacional do “bureau”, responsável por mais de 80% da captação
das informações do grupo, era rateado entre todas as redações.
A indústria dos grandes jornais brasileiros ainda não sabe trabalhar
com o conceito japonês. Suas operações são pesadas e geralmente
concentradas na produção de um único veículo. O grupo Estado, por
exemplo, acaba de tirar o Jornal da Tarde de circulação a pretexto de
que suas energias precisam estar concentradas na locomotiva chamada O
Estado de S. Paulo. Na verdade, o Estadão sempre encontrou dificuldades
para fazer dois jornais e sempre se manteve distante da ideia de fazer
mais de dois.
Inspiração para os grandes
Por certas idiossincrasias dos grandes, o espaço existente para
pequenos jornais de bairro, para jornais gratuitos, populares e outros,
segmentados, tem sido ocupado por empreendedores de origem difusa, sem
compromisso maior com a qualidade da informação. Faltam mais jornais no
portfólio dos grandes jornais brasileiros que sejam úteis para otimizar
custos, maximizar os recursos – que não são baixos – aplicados na
indústria gráfica e na distribuição.
Outro grupo que, no mundo dos impressos, optou pela diversidade é o
RBS, detentor de várias emissoras de TV e de Rádio no Rio Grande do Sul e
em Santa Catarina. Seus impressos são líderes de mercado em toda a
parte: Zero Hora, Diário Gaúcho, Pioneiro, Diário de Santa Maria, Diário
Catarinense, Hora de Santa Catarina, Jornal de Santa Catarina e o A
Notícia. São jornais de circulação regional (Zero Hora, Diário
Catarinense) ou local (Jornal de Santa Catarina, com circulação em
Blumenau, e A Notícia, com circulação em Joinville). O grupo ocupou o
mercado de impressos de Santa Catarina de tal modo que é acusado de
monopólio pelos grupos concorrentes. De qualquer modo, dá demonstração
de que passa ao largo da crise que assola os impressos no mundo todo e
sua estratégia aparenta ser a de aproveitar a vitalidade econômica dos
mercados regionais ou locais. Se operasse em São Paulo, com certeza o
Grupo RBS já teria criado o jornal de Osasco, de Santo André, de São
Bernardo, de Joinville, de Campinas...
RAC e RBS deveriam servir de inspiração para os grandes.
Dirceu Martins Pio é ex-diretor da Agência Estado e Gazeta Mercantil e atual consultor em comunicação corporativa.
(Artigo retirado do Observatório da Imprensa)
(Artigo retirado do Observatório da Imprensa)
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