A participação dos carros 1.0 nas vendas em fevereiro passado caiu ao menor nível desde 1995, com 42,6% dos emplacamentos de automóveis no mês, o que equivale a 86,4 mil unidades. O porcentual comprova o aprofundamento de uma tendência que vem se consolidando há pouco mais de um ano, quando os chamados “modelos populares” deixaram, pela primeira vez em 15 anos, de representar mais da metade das compras de veículos de passageiros no País – o pico foi em 2001, com dominância de 71,1% dos negócios.
“Esse comportamento é resultado de uma mudança no poder aquisitivo da população, com expansão da renda e bônus demográfico (quando a maioria das pessoas de um país está em idade economicamente ativa). Assim muitos consumidores passaram a comprar carros de nível maior”, reconhece Cledorvino Belini, presidente da Anfavea, a associação nacional dos fabricantes. “Mas acreditamos que o carro 1.0 continuará a ter parcela importante do mercado brasileiro”, prevê.
Segundo dados do IBGE, de 2003 ao início de 2011, a renda média dos brasileiros cresceu expressivos 33% e quase 40 milhões de pessoas passaram a integrar a classe média, e outros 9 milhões ingressaram nas classes A e B. Todas essa gente tem poder de consumo para comprar carros, incluindo modelos mais bem equipados e com grau de sofisticação maior do que os oferecidos na década de 1990, quando a política industrial voltada ao setor automotivo criou e incentivou, com impostos menores, o advento do carro 1.0, que agora perde fôlego diante de um consumidor com mais dinheiro disponível.
Tendência aprofundada
Após 2003, foram reduzidas as alíquotas de IPI para modelos com motorização de 1 litro e também para motores 1.6 a 2.0, o que começou a induzir a preferência de compra para modelos um pouco mais potentes. Essa tendência foi se aprofundando ano a ano até 2010, quando o mercado ficou repartido em duas partes iguais, metade para os 1.0 e os outros 50% para os demais.
Esse equilíbrio foi rompido a partir de dezembro de 2010, quando o Banco Central baixou medidas que encareceram o custo dos financiamentos mais longos e sem entrada, justamente os mais procurados pelos novos compradores de carros, que começavam pelos modelos 1.0. Isso tirou algumas dezenas de milhares de consumidores do mercado de zero-quilômetro, ao mesmo tempo em que aqueles que ficaram tinham poder aquisitivo maior, além de um veículo usado para garantir a entrada do financiamento.
Esse conjunto de fatores – poder aquisitivo maior e alguns tipos de financiamentos mais caros – combinou com a oferta de automóveis importados mais bem equipados e com preços competitivos, reduzindo o espaço do carro 1.0 nacional. Alguns concessionários dizem que a participação atual em torno de 43% nos primeiro bimestre do ano seria ainda menor se não fossem as vendas para frotistas, pois nas revendas autorizadas a procura pelos 1.0 já estaria abaixo de 30%.
A situação de mix de produtos atual tornou-se um desafio para a indústria automotiva nacional, que ao longo de duas décadas se especializou na produção de carros 1.0 e agora precisa mudar seus produtos para acompanhar as mudanças de desejos dos consumidores. Para Belini, o setor tem condições de atender a essa nova demanda: "Estamos preparados. Se já temos capacidade de exportar alguns desses modelos, também temos para oferecê-los aqui”, garante.
Os números, contudo, até agora contradizem o presidente da Anfavea. As vendas de importados (a maioria da Argentina e México e todos com motorização e conforto superiores aos 1.0 brasileiros) continuam a crescer mais do que as dos veículos nacionais, mostrando que a preferência do consumidor brasileiro subiu de patamar, enquanto as montadoras permaneceram no mesmo lugar.
Pedro Kutney
Artigo originalmente publicado no portal Automotive Business
www.automotivebusiness.com.br
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