segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

O deputado (e doutor) que não sabe ler imagens

O projeto de lei do dep. Dr. Francisco Evangelista dos Santos de Araújo (PSD/RR) apresentado na última quinta-feira (9), que pretende eliminar o uso de imagens meramente ilustrativas, é reflexo de uma sociedade que, tropeçando ainda nas disciplinas cartesianas, está longe de reconhecer a importância do conhecimento chamado interdisciplinar.

"Nos modernos meios de comunicação (...) o visual predomina, o verbal tem a função de acréscimo", conclui D. Dondis em Linguagem da Sintaxe Visual, leitura obrigatória do primeiro semestre dos cursos de Publicidade e Design. Nesse mesmo livro a autora explica a importância de aprendermos a ler e interpretar imagens, exercício que afirma ser tão importante quanto a leitura de textos. Exemplificando a forma como consumimos com as mídias textual, visual e audiovisual, ela esclarece, contudo, que o fato de alguém não ser capaz de “ler” uma imagem não significa que não possua uma cultura visual. A apreensão da realidade através de imagens é um tema tratado por diversas disciplinas – Filosofia, Semiótica, Psicologia, Ciência Política etc. Mas não, não é necessário ir tão longe.

O uso da imagem meramente ilustrativa no meio comercial tem por finalidade permitir que o consumidor compreenda o que está dentro da embalagem ou atrás do balcão. Por justas regras da Ilustração, também por outras não tão justas, a figura resultante não segue tão fiel quanto uma fotografia. Tudo isso porque a imagem meramente ilustrativa é, antes de tudo, um símbolo. E a imagem-símbolo, como modelo a ser seguido, não deve ser sinônimo de frustração mas ingrediente para uma discussão inteligente, que a projeto de lei algum deve precipitar-se em meter pontos finais.

Talvez o deputado Francisco Araújo tenha quisto regularizar as atividades do “meramente ilustrativo” para que não venha a desconfigurar a composição do produto, exibindo dimensões diferentes frente à proporção humana – o que seria justíssimo –, mas não, infelizmente não é isso que propõe o PL 3187/2012.

Antes mesmo de ser eleito no fim de 2010, o deputado Francisco Everardo Oliveira Silva (Tiririca) viu-se fortemente questionado quanto a sua alfabetização. O assunto ganhou tal repercussão que o candidato de 1,3 milhão de votos foi submetido a um teste de escolaridade e “absolvido” seguidamente. Sugiro aqui que os deputados sejam submetidos, quando necessário, a um teste de imagens – nada daqueles borrões psiquiátricos para atestar a sanidade do paciente; apesar de a ideia também parecer interessante. Um procedimento básico seria: o sujeito sendo exposto a uma série de símbolos para que diga algo sobre cada um, nada demais, apenas um punhado de palavras. Pomba – pássaro; paz; Espírito Santo. Águia de duas cabeças – Igreja e Estado, Passado e Futuro, Império Bizantino, brasão de armas da Rússia (esse logo será presidente, ou ministro da Cultura).

Uma vez aprovado, que o deputado eleito possa trabalhar, dentre as demais necessidades, pela qualidade da Educação. Que venha a zelar por uma sociedade de indivíduos capazes de interpretar textos (inclusive aqueles que reservam seus direitos) e também imagens, julgando aí sua integridade quanto ao que compreende por realidade.

Por André Paulista (contato@andrepaulista.com.br)

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