Acelerar em linha reta, qualquer um faz: este trio é pra quem gosta de tirar o máximo do mínimo
Eles custam menos de R$ 40 mil, fazem quase 10 km/l de consumo médio com etanol, têm manutenção acessível e seguro na faixa dos mil reais. E o mais importante: sejam os dois que já nasceram com o DNA ardido, ou o terceiro que recebeu pimenta extra da fábrica, todos oferecem diversão de sobra aos fãs dos pneus que produzem fumaça no asfalto. Entre, sente-se. E se segure!
Céu de chumbo, asfalto escuro, freada forte em terceira marcha. As rotações do 1.6 Rocam de 107 cv despencam de quase seis mil para 3.500 rpm, enquanto os pneus cantam suavemente, avisando o limite de aderência. A traseira se movimenta levemente, sem exigir correções: os freios traseiros foram calibrados para serem usados ao máximo, e isso ajuda muito o carro a apontar na entrada de curva. Dito e feito. O Ka Sport vai redondo e dispensa chamadas no volante.
Ford Ka Sport
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Ele sabe se comunicar; preço-
Mas faz muito barulho=
Adrenalina a preço de bananaBusco o acelerador cada vez mais fundo, enquanto o raio da longa perna à direita vai se abrindo e minhas costelas se apoiam nas laterais do banco, exclusivo da versão. O volante começa a vibrar levemente – aviso de que a aderência do pneu dianteiro esquerdo está próxima ao limite. Mas não há aquela saída de frente que você espera de um carro comum. O Ford segue neutro, com balanço de calibragem entre a suspensão dianteira e traseira que não é vista nem em alguns carros quatro vezes mais caros.
Dos três, o Ka é a minha escolha pessoal. Nenhum dos outros aponta nas curvas, comunica com a suspensão, direção e freios e diverte quem está ao volante como ele. E olha que o Ford não recebeu nenhum ajuste exclusivo, apenas incremento básico com saias, rodas e pneus, forrações e cluster – a Sport é a única versão disponível para o Ka 1.6. A marca resolveu assumir o seu DNA apimentado de vez.
Para quem sabe
Bem, você está se perguntando o que ele faz em terceiro neste teste. O Ka Sport é um carro de nicho e por isso mercado não é o seu forte. As duas portas são um charme, mas não espere que sua sogra vá entender a ginástica para entrar lá atrás – nem os vidros traseiros fixos ou o ruído de rolagem dos pneus. E, se por um lado a arquitetura do interior do Ka transforma a sua simplicidade em estilo de vida moderninho, por outro, entre no Palio Sporting – ou simplesmente vire três páginas. Você vai entender.
Há outros motivos: o Rocam, o único oito válvulas do trio, não rende tão bem na cidade. Ele bebe como o Palio (8,3 km/l do Ford contra 8 km/l do Fiat), que é 10 cv mais forte e 122 kg mais pesado. E note que suas marchas são longas, o que em tese melhora a autonomia – ao custo de aceleração. Será que um dia ele recebe o 1.6 16V Sigma, mais econômico, 7 cv mais potente e o principal, todo de alumínio?
Quem compra o Ka Sport sabe o que quer. E, provavelmente, na hora de trocar de carro, vai pegar outro. Se o seu perfil é graxeiro, quer o máximo de emoção e é capaz de perdoar as suas mancadas, este é o carro para você. Não há opção que ofereça mais adrenalina por menos de R$ 40 mil.
É possível um carro ser um poço de racionalidade e oferecer emoção ao mesmo tempo? O March SR responde essa. Ele andou mais e bebeu menos, sua cesta básica de peças custa 37% menos que a do Palio e é apenas 14 kg mais massudo que o peso-pena Ka – lembrando que o Nissan tem quatro portas e já traz duplo air bag de série. O que mais? Seu espaço interno é generoso, a qualidade dos materiais de acabamento é boa (apesar de alguns desajustes no painel) e ele, como o Palio, pode ser personalizado com adesivos. No custo-benefício, não existe opção melhor.
Sujeito comportadinho
Mas como é a pegada ao volante? Na mesma curva contornada com o Ka, o March traz também excelente modulação do pedal de freio (ABS, nem como opcional) – rígido na dose certa, sem ser aparelho de academia ou esponja de banho. Mas a calibragem é diferente: ao contrário do Ford, segurar os freios com leveza enquanto se faz a entrada de curva (técnica conhecida como trail braking) resulta em saída de frente, que se mantém insistente no passo de curva e durante a reaceleração. E a direção, bastante leve para uso na cidade, é a menos comunicativa do trio: você não sente exatamente o que os pneus estão fazendo.
Nissan March SR
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Desempenho, consumo-
Pneus, direção sedada, sobriedade=
Samurai em pele de gueixaEste é o tipo de coisa que a engenharia chama de dinâmica segura, e que os entusiastas chamam de conservadorismo. Não que o japa seja ruim, muito pelo contrário: seu baixo peso, casado a suspensão firme e rodas posicionadas nas extremidades, é uma receita e tanto. Você vai ficar na cola de muito carro grandalhão. O problema é ter o Ka como referência, ainda mais usando pneus melhores – o Ford e o Fiat usam Pirelli P7 com 195 mm de largura, enquanto a Nissan decidiu por chineses Maxxis, 20 mm mais estreitos. Não dá pra fazer milagre. Mas você pega o Ka na saída: o March retoma de 80 a 120 km/h simplesmente 4,2 s antes que o Ford.
Agora, por que só falo desta dupla? Eles são os mais emocionantes ao volante. Contudo, em estilo, eles partem para direções opostas: aqui, impera a racionalidade do March – e isso não é tão divertido. Lá dentro, não há diferença nenhuma em relação à versão comportada. E, se você olhar com atenção o spoiler e as saias, vai perceber que elas não foram tão bem integradas: os parafusos são vistos sem esforço e a cor diferente as deixa com cara de acessórios colocados fora da fábrica.
Resumo da ópera: o March SR é o melhor amigo do seu bolso. Anda muito, bebe pouco, manutenção a preço de banana e construção sólida. E, de quebra, quando você chegar naquela serra indo ou vindo do litoral, vai se divertir à beça. Este cara é pra quem não dá tanta bola para estilo rebuscado, mas tem pé pesado.
O páreo é duro. Com o canto dos olhos, vejo à minha direita um BMW 328i da geração E36 – aquela, de meados dos anos 1990 – babando de perto, apenas dois ou três palmos atrás do nariz do Palio. O berro metálico do motor seis cilindros quase cobre o ronco do 1.6 E.TorQ de 117 cv, o mais potente desta reportagem. Repentinamente, estanco no freio com violência. O pedal vibra – sinal de funcionamento do ABS, único carro do trio que oferece este opcional – e transforma os 60 km/h em imobilidade em 16,9 metros, a melhor marca do comparativo. Sinal vermelho. Distraído, olhando para o Palio, o bimmer passa reto no semáforo – e quase causa um acidente.
Fiat Palio Sporting
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Estilo, acabamento, freios-
Peso, ergonomia, consumo, revisão=
Não é só um rostinho bonitoEsta foi a minha primeira experiência com o Palio Sporting nas ruas de São Paulo. Nos minutos seguintes, coisas parecidas aconteceram com motoboys e transeuntes. Com tudo isso, fica difícil dizer que os caras erraram a receita no design desta versão. E eles torraram os tubos e os neurônios. Apesar do preço idêntico ao do March (R$ 39.990), o que ele traz de acessórios visuais não é brincadeira: o spoiler, saias, aerofólio e adesivos também estão ali, como no Nissan. Mas os faróis e lanternas têm máscaras exclusivas, há molduras nos para-lamas, as rodas são aro 16 (calçadas com Pirelli P7) e o interior é um show à parte: aplicações no painel, revestimentos diferenciados nos bancos, volante, tapetes e painéis de porta, pedaleiras e cintos bordô – versão mais elegante que o vermelho-berrante dos cintos do antigo Palio 1.8R. Acha que acabou? Surpresa: ele traz pimenta nas entranhas. Se segura aí, já falaremos disso.
O Palio Sporting passa a sólida impressão de ser um carro de categoria superior em relação ao March e ao Ka, até porque ele é mais corpulento: o Fiat pesa 122 kg a mais que o Ford e 108 kg a mais que o Nissan – dá um Minotauro (aquele, do UFC) de diferença.
Grandalhão gentil
Mais massa não é bom negócio pra quem gosta de andar pendurado nas curvas. Com mais inércia em jogo, o carro perde agilidade em mudanças de direção, acelera menos e tende a frear em distância maior. Mas o Palio Sporting não é só rostinho bonito.
Para reduzir o jogo de transferência de peso, ele ficou 5 mm mais baixo e as bitolas (largura dos eixos) foram alargadas em 6 mm na frente e 10 mm atrás. E para deixar as respostas ao volante mais afiadas, a caixa de direção do Essence 1.6 foi substituída por outra 7,8% mais direta e a suspensão recebeu molas e amortecedores mais firmes. Tem mais: os freios foram redimensionados, o diferencial foi encurtado (de 3,86:1 para 4,06:1) e a rotina de abertura dos corpos de borboleta foi remapeado, resultando em respostas mais ardidas do motor em rotações baixas e médias.
Não que ele tenha virado um Subaru WRX. Apesar da cara de malvado, o Palio ainda é cara de família e roda consideravelmente mais macio e quieto que Ka e March. Agora, o Minotauro extra pesou no Fiat, que não tem dinâmica tão cortante, bebe um pouco mais e chega aos 100 km/h quase um segundo depois do March. Mas não se engane: ele acompanha os outros nas curvas – tanto que gerou o mesmo pico de aceleração lateral, 0,76g. E, como no Nissan, próximo ao limite sua frente começa a espalhar. Só não deixe o Fiat sair da pista: sua cesta básica é 37% mais cara que a do March, seu maior ponto fraco.
Dos três, o Palio Sporting é o mais sofisticado e que entrega o pacote mais tentador. Você desembolsa mais por isso, mas o benefício é maior que o investimento. Sem contar que ele é o único que recebeu pimenta da fábrica pra justificar a cara de Anderson Silva. O grandalhão gentil merece o topo do pódio.
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