segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Esporte ainda demanda evolução e profissionalização no Brasil

Especialistas analisaram tema durante a SoccerEx, realizada pela terceira vez no país


Se há um negócio em que parece não haver crise, é no esporte — em especial, no futebol. A grande feira SoccerEx, realizada na semana passada no Rio de Janeiro e pela terceira vez no país, mais uma vez provou a força desse negócio, que ainda tem muito que se profissionalizar no Brasil. Apesar de sermos o país do futebol, por aqui as coisas não andaram como em outros mercados, como o europeu.
Questões econômicas e principalmente culturais ainda servem de entrave, mas o fato é que o Brasil sediará uma Copa do Mundo dentro de dois anos e terá de superar as barreiras para que tudo funcione a contento. “O esporte hoje movimenta algo como R$ 79 bilhões e a partir de 2013 o deslocamento de verba será ainda maior. A indústria cresce porque há um movimento global de vínculo ao esporte. E uma coisa é certa e comprovada em pesquisa: marcas que se vinculam ao esporte são mais valorizadas pelos consumidores”, disse Walter de Mattos Jr., presidente do jornal Lance!, durante o painel “O poder da imagem no esporte”, que discutiu direitos de imagem e principalmente a relação às vezes conturbada entre clubes, marcas e atletas.
Mattos defendeu que empresas precisam agir com mais planejamento, inserindo o investimento em esportes na estratégia de marketing e não utilizando-se dele de maneira oportunista. “Ao patrocinar um jogador ou clube, é preciso avaliar o que isso de fato tem a ver com a estratégia da empresa. Muitas vezes, a companhia patrocina um clube ou um atleta, mas não dispõe de verba para ativar o patrocínio. Isso é um grande erro”, comenta.
Em sua opinião, quanto melhor planejado o investimento, maior será o retorno e mais o negócio como um todo irá crescer, pois as vantagens e o retorno do investimento se mostrarão mais claramente. “Investimento em esporte não pode se resumir em compra de propriedade ou mídia. É preciso haver estratégia clara, com ativação massiva e criativa, seguindo as práticas dos Estados Unidos e da Europa. Não podemos viver uma fase de euforia e depois num abismo pós-evento”, concluiu Mattos.
À moda antiga
Para Ricardo Fort, diretor global de marketing esportivo e patrocínios da Visa, a forma como os detentores de direitos esportivos olham para os patrocinadores ainda é antiga, como “financiadores” do negócio. “Nunca assinamos um contrato se não temos pelo menos três vezes o valor da verba para ativar. Não ativar um patrocínio é um desserviço”. O executivo disse que há uma percepção geral de que o patrocinador é um mal necessário, que obriga atletas a fazerem coisas estranhas. “O patrocínio deve contar uma história. E se for boa, todo mundo vai querer ouvir e fica contente. Mas é importante comprar a história certa”.
Mattos diz que um dos sinais do amadorismo que ainda existe no país é a famosa profecia autorrealizável de que a mídia espontânea justificará um patrocínio, o que em geral não acontece, e a consequência é o fim do investimento. “É um vício no Brasil. Quantas empresas entraram como patrocinadoras do vôlei, por exemplo, e saíram. A mídia é apenas um elemento da equação”.
O jogador holandês Ruud Gullit confessou que se tornou escravo da própria imagem e que sua decisão de cortar o cabelo — um rastafari que ficou conhecido mundialmente — teve a ver com o desejo de se libertar. “Sabemos que patrocínios são importantes, mas, em muitos casos, os direitos dos atletas são esquecidos. Há muitos agentes envolvidos com muitos interesses diferentes e está cada vez mais complexo”. Maurício Assumpção, presidente do clube carioca Botafogo, concordou com os demais participantes do debate que o único caminho é profissionalizar cada vez mais a gestão dos clubes. “O clube é gerenciador da relação atleta/patrocinador. Profissionais preparados devem falar abertamente com os jogadores a respeito do fato de eles serem parte integrante dessa relação e o quanto ela é importante para o clube. E deixar claros os papéis de cada um”.
Para o dirigente, o projeto de naming rights de estádios é um excelente negócio no Brasil, que ainda não emplacou principalmente por falta de gente capacitada para entender o real potencial do negócio. Um dos grandes problemas dos clubes, hoje, é como transformar os jogos em atração para toda a família. O projeto de naming rights deve emplacar a partir do ano que vem, quando valerá a regra de que o nome oficial do estádio deverá aparecer nas chamadas oficiais da mídia, o que até hoje não era obrigatório e prejudicava eventuais patrocinadores.
Gestão
Também há falta de bons profissionais de gestão esportiva no país. Cecília Yoshizawa, vice-presidente de gestão de talentos do grupo IMX, disse que ainda não há mão de obra no nível necessário para que o negócio evolua como um todo. “O Brasil é atípico. Temos que tomar conta dos atletas, às vezes de suas famílias. Aqui o relacionamento humano supera o profissional, muitas vezes. Mas estamos melhorando, há gente jovem chegando”.

Fernando Von Oerzer, vice-presidente de esportes olímpicos da XYZ, acredita, como Mattos, que planejamento é a palavra-chave para investir em esportes e que o caminho é buscar empresas especializadas para evitar o amadorismo. “A gestão do atleta vai muito além do patrocínio, por isso é preciso buscar empresas especializadas”. Mattos acredita que está na hora de “rasgar a fantasia” e buscar bons profissionais no exterior para trabalhar por aqui. “Há um claro problema de gestão do esporte e nem todos terão o retorno adequado. É preciso investir em bons profissionais ‘ontem’”, avisou.
Copa sem 3D
Esta não deve ser a Copa do 3D no Brasil. É o que acredita Marcelo Campos Pinto, diretor executivo da Globo Esportes, durante a discussão sobre o futuro dos direitos esportivos, que contou com a participação de Stephen Nuttall, do YouTube, na área esportiva. Ele acredita que ainda há muito a melhorar na transmissão em alta definição (HD) antes de se pensar em 3D que, segundo o consultor inglês Andrew Croker, não é atraente para esportes. A forma como os direitos de transmissão esportivos são negociados no Brasil — em separado, com cada clube, pagamentos antecipados e outras peculiaridades — foi considerado arcaico.

O papel do YouTube foi amplamente discutido no painel e Nuttall esclareceu que não considera a rede concorrente de qualquer outra plataforma. “Somos naturalmente complementares. Em alguns casos trabalhamos com emissoras para permitir o streaming de eventos ao vivo, mas ainda assim, nosso conteúdo agrega, não substitui”, disse.
Na Copa, não será diferente. Nuttall acredita que o YouTube será um canal complementar e que poderá ser usado inclusive pelas emissoras para disponibilizar material profissional para torcedores. O conteúdo profissional, por sinal, aumenta cada vez mais. “A internet não matou a TV. Hoje aumenta o tempo que as pessoas passam diante da TV. Estamos na era das duas ou três telas vistas ao mesmo tempo. Acredito que o YouTube pode ser complementar para as emissoras”.

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