quarta-feira, 20 de junho de 2012

3 soluções para o trânsito de São Paulo, doa a quem doer

O vai e vem do trânsito paulistano e seus mais de sete milhões de veículos conseguem acabar com o dia de qualquer um. Mudar este cenário, porém, vai doer a muita gente

 

São Paulo - Hoje, o cidadão paulistano saiu para trabalhar e encontrou mais de 100 quilômetros de vias congestionadas, cifra que soa absurda para motoristas de outras cidades, mas já é vista com certa naturalidade pelos paulistanos, embora dosada com variados graus de indignação. O recorde do ano foi de 295 quilômetros, às 19h da sexta-feira, 1º de junho.

O resultado é o prejuízo calculado em 56 bilhões de reais para a economia da cidade neste ano, segundo um estudo da Fundação Getúlio Vargas.
São 7,3 milhões de veículos trafegando nos mais de 17 mil quilômetros de vias pavimentadas da cidade. As soluções são discutidas há décadas, mas, como exigem vontade política aliada a mudança de hábito dos cidadãos, as transformações geralmente resumem-se a tímidas alterações cirúrgicas lá e cá.
Confira três soluções indicadas por especialistas que poderiam mudar o cenário nas vias urbanas de São Paulo, com gasto relativamente pequeno se comparado a obras viárias faraônicas. Antes de causar algum sorriso, porém, elas causariam dor.
1 Pedágio urbano
Dói para quem: todos os motoristas de veículos particulares, especialmente os de menor renda
Resolve para quem: o governo, que arrecada
Se tem assunto que arrepia qualquer brasileiro é a criação de novas tarifas – ou o aumento das que já existem. A criação do pedágio urbano, porém, teria efeitos “imediatos” no trânsito da capital paulista, na avaliação do presidente do Instituto Brasileiro de Segurança no Trânsito (IST) e professor da Universidade de Brasília, David Duarte.
Os motoristas de plantão podem começar a se preocupar. Apesar de já ser discutido há mais de duas décadas, o pedágio urbano ganha contornos cada vez mais reais. Projeto do deputado estadual Carlos Apolinário (DEM) passou na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Municipal no dia 25 de abril, mas ainda tem que passar por outras comissões antes de seguir para o plenário.
O deputado Apolinário prevê que a cobrança de 4 reais para acessar a área do chamado centro expandido durante a semana traria uma redução de 30% na quantidade de veículos nas ruas, mas para o consultor em engenharia de tráfegos e transporte Horácio Figueira, este valor teria que ser maior para obter esse efeito.
Na avaliação dele, as pessoas pagariam os 88 reais por mês atraídas pela ideia de ter a rua só para elas. “Mesmo que você tenha redução, você não vai nem perceber”, acredita o especialista. Em Londres, onde a prática começou em 2003, o valor atual cobrado é de 10 libras.
Aumentar o valor, no entanto, seria entregar “as ruas aos ricos”, argumenta Figueira. Assim, a equação é difícil de resolver. Deve ser por isso que existe pouca certeza se o pedágio urbano realmente sairá do papel. A única garantia é que não será em ano de eleição.
2 Mais corredores de ônibus
Dói para quem: todos os motoristas de veículos particulares
Resolve para quem: usuários de transporte público
Nenhum cidadão consciente se opõe a um melhor transporte público. Mas quando a melhora não se dá apenas debaixo da terra, no metrô, mas exige retirar centenas de quilômetros de faixas hoje ocupadas por carros e entregá-las exclusivamente aos ônibus, a resistência tende a ser maior.
“Congestionamento para mim é inevitável, mas congestionamento de ônibus é imperdoável”. A máxima é do especialista em trânsito Horácio Figueira e serve como síntese de pensamento de muitos que se dedicam a estudar a mobilidade urbana.
Nos cálculos de Figueira, para tornar as viagens dos ônibus mais fluidas, seria necessário mais do que triplicar o tamanho da malha de 120 quilômetros de corredor que a cidade tem hoje. Ele pede mais 400 quilômetros (veja sugestões do especialista abaixo).
A título de comparação, nos últimos cinco anos, foram inaugurados menos de quatro quilômetros. Na impossibilidade de fazer o corredor, que demanda o reforço do pavimento, até mesmo faixas exclusivas têm bom resultado no curto prazo, pois são de fácil implantação.
Esta transformação mudaria a configuração das vias de maior movimento da cidade, colocando ônibus até onde hoje há apenas duas faixas, deixando uma exclusiva para os coletivos. Seria uma saída para aumentar a velocidade média nos corredores, de apenas 15 km/h, uma vez que os coletivos alternam trechos com e e sem reserva de espaço.
Mas se já seria ruim perder uma faixa, o que diria o motorista que perdesse duas – onde houvesse três - para que os ônibus pudessem fazer ultrapassagem e não ficassem presos com o vai e vem de passageiros de outros ônibus? A sugestão de Figueira é que isso ocorresse pelo menos nos horários de pico em vias como a Rebouças, para ficar em apenas um exemplo.
“Se é mais rápido chegar de transporte público, as pessoas naturalmente vão optar por este tipo de mobilidade”, afirma David Duarte, da Universidade de Brasília.
Os motoristas, por consequência, avistariam da janela de seus carros, parados, os ônibus seguindo em grande velocidade.


Levantamento do consultor Horácio Figueira para possíveis mini-corredores de ônibus em SP
Levantamento do consultor Horácio Figueira para possíveis mini-corredores de ônibus em SP
 
“A implantação de corredores não precisa ser de quilômetros, duas quadras antes de um semáforo já justifica”, opina Horácio Figueira, defensor da ideia.
3 Corte de incentivos à venda de veículos
Dói para quem: as montadoras e, em última instância, a cadeia que gira em torno delas, incluindo os funcionários
Resolve para quem: usuários de transporte público e motoristas de veículos particulares
Desincentivar a venda massiva de carros – exatamente o oposto da política industrial do governo em épocas de crise – não vai mudar as vias paulistanas do dia para a noite. Mas, para os especialistas, há potencial a médio prazo para a medida.
Todos os dias, mais de 600 novos carros começam a circular na capital paulista. O problema é que automóveis os velhos são aposentados em ritmo muito menor.
“O grande regularizador do trânsito em São Paulo é o Ministério da Fazenda”, sintetiza o consultor em engenharia urbana e ex-colaborador da Companhia de Engenharia de Tráfego, Luiz Célio Bottura.
Diante de dificuldades de competitividade do setor e para ajudar a alavancar a economia, o governo federal já reduziu o IPI de automóveis tanto no auge da crise de 2009 e novamente no mês passado, com resultados imediatos no número de emplacamentos.
Por outro lado, é dificil esperar que o governo pare de estimular setor que movimenta 1 de cada 10 reais da economia brasileira, considerando toda a cadeia. Se a indústria passasse a produzir menos, seriam inevitáveis também demissões.
Enquanto essa equação não se resolve, fica a pergunta de até quando será possível manter o atual modelo e o peso da indústria automobilística na economia brasileira. “A gente apostou todas as fichas na solução individual. Só que a solução individual é o caos social”, afirma David Duarte, do IST.

 

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