sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

E aí, sua marca já pegou os consumidores?

Tenho que me render aos fatos. Tenho amigos na Espanha, acabo de voltar de Buenos Aires, falei com uma amiga na França. Em todos os lugares a música “Ai Se Eu Te Pego”, de Michel Teló, é um fenômeno. Inevitável resvalar na discussão sobre as virtudes ou não de criador e criação. Evitável, porém, cair na tentação fácil de criticar e dizer que é ruim, que não presta e que é culturalmente nefasta.


Essa análise fácil, muitas vezes, concentra um preconceito além do julgamento de qualidade que, em especial, quem trabalha com comunicação deve evitar. Se um produto é ruim e consumido por milhões, isso significa que esses milhões são ruins, desqualificados? Com tal argumento desqualifica-se o outro a partir de sua opinião.


Ouvimos em todas as eleições o bordão de que o brasileiro não sabe votar. Inclusive, recentemente muitos dos chamados formadores de opinião disseram que foram os ignorantes que elegeram a presidente Dilma. Fizeram apologia sobre os votos do Nordeste como exemplo de preconceito. Seríamos uma minoria intelectualmente privilegiada circundada por um mar de ignorantes? Essa minoria está sendo sujeitada pela maioria incompetente?


Nunca concordei e sigo discordando disso. Sou capaz de apostar que, com a força da internet, a grande maioria dos fãs de Teló, principalmente os que pagam para ir aos shows, são jovens de classe média. Se não fosse assim, as patrocinadoras do cantor não seriam marcas líderes em seus segmentos. A indústria cultural é mais forte do que um simples rascunho de posicionamento ideológico, e este não é o espaço para essa discussão nem o objetivo desta coluna.


Rapidamente vou comentar algumas impressões que podem ser lidas aos olhos do marketing também. Em tempo: não gosto da música nem das outras que busquei ouvir no site de Teló. Mas tampouco gosto de Djavan e não bebo champanhe. Tenho um grande amigo que não gosta de Chico Buarque e nem por isso acho que ele seja um imbecil.


“Ai Se Eu Te Pego” não é uma cantata. É entretenimento e não é possível olhar para ela como arte. É uma melodia simples, um jingle com uma coreografia. Esse conjunto ganhou visibilidade com terceiros. Jogadores de futebol comemorando gols com o gesto. Cristiano Ronaldo fez isso em novembro. Neymar já havia feito e depois foi do campo para o palco com Teló. O gol é a alegria com um gesto.


O gesto escolhido foi o mesmo usado na música. O vínculo da alegria está feito com bons embaixadores no Brasil, Europa, EUA e até o famoso vídeo de soldados dançando (que chego a duvidar da autenticidade, pois fico chocado com alguém dançando com uma arma na mão, em especial se for mesmo soldado israelense em conflito com palestinos dizendo “ai se eu te pego”. Por favor, chame o ladrão!).


A música estoura em diversos pontos do globo terrestre por estar associada a um processo de alegria em um mundo afundado numa crise econômica e desprovido de ideologia. Assim, a música ecoa porque tem campo e concentra de alguma maneira o interesse das pessoas. Cansadas, elas querem alegria. Entretenimento. A realidade é mais dura do que qualquer música pode supor.


No caso brasileiro é mais simples. Temos centenas de sucessos estonteantes que desaparecem instantaneamente. Nossa maior festa – o Carnaval – é essencialmente musical. As marchinhas eram anuais, algumas permaneceram. “Lembra daquele cara que fez aquela música?”, pergunta um, entre uma cerveja e outra no boteco. “Fez só aquela e desapareceu”, é a resposta mais comum. Alguém na mesa ao lado lembrará de pelo menos cinco casos iguais. Pense bem e você também lembrar de alguma festa em que caiu na farra dançando e cantando aquela música daquele esquecido autor.


O termo “aquela” é empregado porque fulano não fez outro sucesso. Falar em fenômeno é descrever um acontecimento instantâneo, que surge como um raio e desaparece. Um fenômeno não dura. Dizemos que não temos memória. Muitas vezes não temos quem tenha capacidade de escrevê-la.


O ensinamento de Michel Teló

No caso específico deste fenômeno é possível utilizar a letra e a música para fazer algumas relações interessantes vinculadas ao marketing. A primeira delas é se você tem conseguido pegar seus consumidores pelo ouvido e pelo gesto (vou ouvir brincadeiras sobre o gesto da dança e o gesto que a marca não deve fazer com os consumidores – ossos do ofício); ou se você tem feito com que sua marca seja lembrada e transformada em gesto de compra. Existe adesão? Ela é de curto prazo ou terá durabilidade? Sua marca terá capacidade de extensão de linha ou está fadada a apenas um hit de verão? Olha para o futuro, seduz os consumidores?

Olhar para a realidade e entender a conjuntura é parte do trabalho do marketing e da comunicação. O sucesso da música em um mundo cada vez mais globalizado, ganhando versões em diversas línguas, tem de ser observado como parte de um desenho atual da realidade. Estamos diante de mais uma oportunidade de entender o comportamento muito mais do que olhar para uma música. Mas é preciso olhar para o lado certo. Descer do pedestal de juiz do gosto alheio especialmente evitando criar pessoas de primeira e de segunda (“quem não gosta do que eu gosto não é inteligente e quem gosta do que eu não gosto é imbecil”).


Os acontecimentos estão aí e resgato uma velha frase que já vi citada em parábolas budistas e na caneta de autores diversos (se alguém souber o autor exato, informe): “eu estou apontando a lua e eles estão olhando meu dedo”. Creiam: a música não é a lua.

Adalberto Viviani é presidente da consultoria Concept.

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