quinta-feira, 1 de março de 2012

Coca-Cola quer dobrar de tamanho até 2020

Para atingir a meta, uma das soluções é tornar suas marcas as mais comentadas entre os jovens. É o que diz Jonathan Mildenhall, vp de marketing estratégico e comunicação criativa da companhia

Ele não gosta de concorrências e prefere promovê-las apenas se for necessário. Justamente porque faz parte de seu trabalho conhecer a indústria da propaganda, incluindo as principais agências dos mercados mais relevantes para a Coca-Cola. Também defende que as ações publicitárias estejam onde a audiência está, o que o fez reduzir a verba que a companhia investe em TV em diversos países. Jonathan Mildenhall, vice-presidente global de marketing estratégico e comunicação criativa da Coca-Cola, esteve em fevereiro no Brasil para trabalhar na campanha para a Copa do Mundo de 2014, que considera o momento para fazer o melhor espetáculo possível, colocando em prática o conceito da liquidez da ideia, apresentado no Cannes Lions 2011. Na época, obteve grande repercussão ao anunciar o novo caminho que a empresa iria seguir em suas ações de marketing. Nesta entrevista ao Meio & Mensagem, Mildenhall fala de assuntos polêmicos, como a remuneração das agências que atendem as marcas da Coca-Cola e o formato de contratação por fee, adotado recentemente. E revela que, até 2020, a companhia quer dobrar de tamanho o seu negócio. Como? Fazendo os consumidores falarem de suas marcas, cada vez mais.

Meio & Mensagem ›› Em sua apresentação no Cannes Lions 2011, seu tema foi o “Futuro é líquido” (ideia segundo a qual parte da comunicação se “desprende” e se espalha por conta própria no mercado, engajando o público). Desde então houve alguma evolução? O conceito ainda é válido, em meio à rapidez do digital?
Jonathan Mildenhall ›› A ideia ainda é válida. No Cannes Lions fizemos uma declaração de nossas intenções. Nos últimos seis meses, começamos a colocar o conceito em prática com a campanha para a Olimpíada de Londres, que é a primeira materialização desse conceito. Nos Jogos de Pequim criamos apenas uma dúzia de peças de conteúdo que foram veiculadas ao redor do mundo. Para Londres, são provavelmente 200, que realmente personificam essa ideia. Cada uma das peças foi desenhada para engajar adolescentes em uma conversa com a gente. 
Meio & Mensagem ›› No Super Bowl, a Coca-Cola usou o Facebook e os ursos polares para ganhar a atenção da audiência. Qual foi o resultado dessa estratégia? 
Jonathan Mildenhall ›› Tivemos dois formatos de resultados para o Super Bowl este ano. No tradicional, que aponta os trabalhos favoritos, nossa campanha não esteve listada entre as dez primeiras. Com esse ranking, ficamos sim desapontados. Mas há um novo formato de resultados que mostra qual a campanha que gerou a maior conversação e nesse a Coca-Cola se destacou, foi a primeira colocada. Isso porque integramos a TV com as mídias sociais, mobile, Twitter.  

M&M ›› A campanha de Londres 2012 envolve todas as mídias ou vocês priorizaram alguma especificamente? 
Mildenhall ›› Londres tem uma inclinação musical. Por conta disso, tudo que fizemos tem como base a música. É uma cidade famosa por sua herança musical. Usamos os sons dos esportes e da música para criar um hino fantástico. Justamente por conta dessa característica, achamos que esta campanha poderia envolver todos os meios. Usamos todos os canais possíveis, das mídias sociais à TV, passando por ringtones experimentais, mobile etc. Estamos usando mais canais de mídia do que jamais fizemos em ações anteriores no mundo.
M&M ›› Qual agência está à frente dessa campanha? 
Mildenhall ›› A Mother London está à frente do trabalho principal, mas trabalhamos também com a M&C Saatchi, nossa agência de relações públicas. Temos ainda uma agência musical, a Cake, e uma de design, a Attik. Elas atuam de forma colaborativa e com base nesse trabalho de colaboração fazemos a remuneração.
M&M ›› A Coca-Cola anunciou recentemente uma redução em seus custos, algo entre US$ 550 milhões e US$ 650 milhões, que acontecerá entre 2012 e 2015. Pode afetar o trabalho criativo que vem sendo feito?
Mildenhall ›› Não acredito. Vamos procurar novas formas de prover conteúdo e produzi-lo rapidamente. Nos Jogos de Londres, por exemplo, as peças out-of-­home foram feitas diretamente com um fotógrafo, sem nenhuma agência. Desenvolvendo algumas ideias internamente e executando-as dessa forma, garantimos o investimento de toda a verba em conteú­do e menos em fees. Esse é apenas um exemplo no qual o investimento direto no conteúdo funciona melhor porque o processo de criação em torno dele pode aumentar incrivelmente o preço.
M&M ›› O presidente da Coca-Cola, Muhtar Kent, disse que a verba economizada será realocada em marketing e na construção da marca. Como acontecerá? 
Mildenhall ›› Não somos nada sem investir em nossas marcas. Nossa tarefa é fazê-las relevantes e contemporâneas para o nosso público-alvo. Temos um plano ambicioso de dobrar o tamanho do nosso negócio até 2020. Isso significa que temos de fazer os adolescentes pensarem em nossas marcas com uma frequência maior a cada dia.  
M&M ››  E, para você, no final, o que é mais importante?
Mildenhall ›› Em 2020, meu objetivo é a conversa, o diálogo com o público-alvo. Não quero que vejam uma propaganda nossa e não falem da gente, o que significaria que não estamos dominando a conversa. Enquanto estivermos sendo os mais comentados, estarei mais feliz.
M&M ›› Como as marcas podem avaliar a importância das mídias sociais em suas campanhas e estratégias de marketing? O Facebook é mais interessante que um hotsite, por exemplo? 
Mildenhall ›› Como nossas marcas são tão populares, temos uma posição privilegiada. Os adolescentes querem criar histórias sobre a Coca-Cola. No Facebook, 80% das histórias sobre a marca são feitas por eles, nós estamos à frente de apenas 20%. Eu já tenho toda essa conversa acontecendo e não estou no controle delas, não as crio e não pago por isso. Para mim, isso é muito mais excitante do que ter microsites que as pessoas têm de entrar e para os quais tenho de desenvolver o conteúdo. Meu trabalho é inspirar adolescentes ao redor do mundo a tirarem suas próprias fotos, criarem suas músicas e fazerem tudo para a Coca-Cola. Estar no Facebook pode ser muito mais inspirador e mais importante e relevante do que ter microsites.
M&M ›› Falando ainda da mídia social, quem cuida disso na Coca-Cola? O marketing? Uma área específica focada no digital? Ou o trabalho é concentrado nas agências? 
Mildenhall ›› Essa área é o grande foco da The Coca-Cola Company nos próximos dois ou três anos. Temos de dominá-­la. Hoje, em cada mercado, isso é feito de uma forma. Às vezes junto à marca, outras com as agências de publicidade. Estamos aprendendo como inspirar e criar diálogo com o consumidor. O universo do marketing está tentando aprender isso. Olho as melhores práticas no mundo, a abordagem sul-americana, a forma como os russos fazem, britânicos, brasileiros, americanos. Meu trabalho é identificar as melhores práticas, o mais eficiente, e depois fazer uma espécie de guia global para mostrar como devemos atuar. No momento a resposta para essa pergunta seria: fazemos de todas as formas que você citou. Em cada mercado, é de um jeito.
M&M ›› Como a Coca-Cola define as agências que farão suas campanhas locais e globais? 
Mildenhall ›› Não gosto de concorrências. É meu trabalho conhecer a indústria da publicidade em cada mercado em que atuamos, para que não precise fazer concorrências. Até na Copa do Mundo, talvez nosso maior impacto na área de mar­keting, não promovemos concorrências. Vim ao Brasil e viajei pelo País com o Gian Martinez (gerente de excelência criativa da Coca-Cola Brasil) para conhecer as agências locais. Após essa ronda definimos a Wieden+Kennedy São Paulo para ficar à frente de 2014. Nos principais mercados da Coca-Cola meu trabalho é conhecer as agências, tanto para atuar localmente quanto globalmente, garantindo escolhas certas. Realmente tento promover o mínimo de concorrências. 
M&M ›› Existem rumores de que a Coca-­Cola não paga grandes remunerações às suas agências. É verdade?
Mildenhall ›› Nós acreditamos em criar valor compartilhado. O trabalho que cria valor para os acionistas da Coca-Cola deve também criar valor para as agências. Globalmente éramos uma companhia que dava grandes comissões. As agências recebiam comissões em todo o mundo baseadas nos nossos gastos com mídia, mas esse era um modelo ineficiente para a Coca-Cola. Agora trabalhamos por meio de fees. Pagamos com base no valor: olhamos cada job desenvolvido e avaliamos o valor que ele cria para a gente globalmente e em mercados locais. Com esse novo formato, não queremos que as agências deixem de ganhar dinheiro com a gente, mas também não queremos que recebam quantias exorbitantes só porque seu trabalho está em todo mundo. Calculamos o valor com base no modelo de compensação, o que nos dá a certeza de que os acionistas das agências e da Coca-Cola serão remunerados da forma correta. É nisso que acreditamos.
+ Mildenhall: "estamos aprendendo como inspirar e criar diálogo com o consumidor. O universo do marketing está tentando aprender isso" Crédito: Felipe Varanda
 

M&M ›› Como a Coca-Cola divide os investimentos entre novas mídias e as tradicionais? (*) 
Mildenhall ›› Não há uma regra, é diferente em cada local do mundo. Tenho muito orgulho em dizer que, quando comecei nesta organização há cinco anos, 80% dos nossos investimentos em marketing estavam na TV. Agora isto mudou, tivemos uma baixa nas verbas destinadas a esta mídia em quase todos os mercados, temos uma posição muito mais reflexiva. Claro que em alguns países a TV ainda domina. Na Índia, por exemplo, 90% de nossa verba é destinada a ela. Mas por outro lado, no Reino Unido, apenas 25% de nossos investimentos vão para a TV. Meu principio global é que devemos estar onde a audiência está.
M&M ›› Conhece o projeto brasileiro Coletivo? Ele é uma forma de inovar a relação entre o conteúdo da companhia e seus consumidores? (*) 
Mildenhall ›› A coisa da qual mais me orgulho no Brasil é o “Coletivo”. Tenho orgulho dos resultados, da iniciativa em si, de ser um esforço brasileiro. Deveria levar esse projeto para outros cantos do mundo, usar as mesmas ideias em mercados como Malásia, África do Sul, Indonésia. O que acho excitante é que ele tem dois lados: o social, que dá habilidades para desenvolver um negócio, e o artístico, que fornece ferramentas para que as comunidades exerçam sua criatividade, se expressem. É realmente entusiasmante.  
M&M ›› Como vocês estimulam as agências de publicidade a criarem boas campanhas? (*)
Mildenhall ›› Meu trabalho é inspirar os criativos, mas às vezes a questão do tempo é muito complicada. Em outras temos bastante tempo para desenvolver uma campanha, como na Copa de 2014, na qual já estamos trabalhando há seis meses. Neste caso, minha missão é gerenciar a inspiração criativa de pessoas brilhantes como a equipe da Wieden+Kennedy São Paulo, administrando seu entusiasmo, excitação e visão nos momentos certos. Quando entrei na companhia a primeira coisa que me disseram foi que o maior valor que poderia dar para a Coca-Cola seria inspirar pessoas criativas a trabalhar com a gente e é o que tenho que fazer. Deixar todos inspirados pelo potencial de nossas marcas.
Este conteúdo é parte da entrevista publicada na edição 1498 de Meio & Mensagem, com data de 27 de fevereiro. Os itens sinalizados com asterisco (*) representam material exclusivo do site.

 

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